Horário de verão

Do padre Orivaldo Robles:
orivaldoEstou correndo o risco de receber paulada dos que pensam de forma diferente. Não sou versado nas ciências que tratam do assunto. Ainda assim, me arrisco a palpitar sobre o horário de verão, já em vigor. “Livre pensar é só pensar”, dizia Millôr. Exerço o direito de reclamar à toa, o “jus sperneandi”.
Não gosto desse horário. Jamais gostei. E não sou o único. Ele coleciona inimigos, assim como defensores, não sei em que proporção. Na Câmara dos Deputados repousam três projetos de lei, à espera da chance de o mandarem todos sabem para onde. Sinal de que também o detestam pessoas bem mais importantes que este obscuro escriba.
Todo ano, no terceiro domingo de outubro, desce um pesado mal-estar sobre meu corpo que, há tempo, consumiu os anos radiosos da juventude. Confesso que a primeira semana é braba. Depois, pouco a pouco, a máquina se adapta. Assim mesmo, pegando só no tranco. E contando os dias que faltam para o terceiro domingo do fevereiro seguinte.
Ouvi falar que esse horário é bom para aposentados. Também para quem pega no batente às nove da manhã. Ou ainda para os que dão expediente à tarde. Não tenho como comprovar. Cada um sabe de si. Agora, para quem pula da cama às 5h45m, inclusive nos sábados e domingos, não tem graça nenhuma. A sensação que me traz é a de que estou sempre atrasado. Parece que sobram obrigações no fim do tempo disponível para cumpri-las. É só descuidar um tiquinho que o relógio, implacável, vem buzinar na minha cabeça avisando que é tarde. Que amanhã o dia começa antes das seis. Não sei como alguns foram inventar que os dias se tornam mais longos. Que se conseguiu grande lucro com a ideia de retardar artificialmente a hora do pôr-do-sol.
Andei lendo que nos países equatoriais e tropicais a luz solar é quase a mesma, o tempo todo. Não há grande diferença entre os vários períodos do ano. No Brasil a distinção entre as quatro estações é mínima. Sem consultar a folhinha, quem sabe dizer em qual estamos? Entre maio e agosto (ou até setembro) temos dez ou doze dias frios. Fora deles, os outros são bem parecidos. Em países como o nosso não há vantagem em observar horário de verão. Tanto que o Brasil é o único país equatorial do mundo que o adota hoje.
Parece discutível o argumento de que esse horário produz grande redução no consumo de eletricidade. Entre nós ele serve, mais que tudo, para garantir o funcionamento confiável do atual modelo energético. O governo visa afastar apagões que escurecem regiões imensas, uma vez que são interligadas. Ao retardar a ligação simultânea da iluminação de todas as cidades, consegue equilíbrio na distribuição do consumo em horário de pico, isto é, quando escurece.
Não entendo do assunto, mas tenho direito de pensar: com as colossais potencialidades de energia eólica e solar de que o Brasil dispõe, por que investir apenas (ou de forma quase exclusiva) na geração de eletricidade a partir da matriz hídrica? Tapando o ouvido à grita de gente séria e entendida, dirigentes do país parecem interessados só em explorar (ou degradar?) nossos fantásticos rios e seus ricos entornos. Ou seria sujeição à ganância de empreiteiras financiadoras de campanhas eletivas? É uma dúvida plausível. Perguntar não ofende, né?

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