Forças da natureza

De José Luiz Boromelo:
apagaoMais uma vez o País sofre com interrupções de energia elétrica que causam transtornos imensos para a população. Os apagões se tornaram freqüentes deixando prejuízos, irritação e a sensação de que as coisas podem piorar ainda mais. Num ano atípico em que os índices pluviométricos ficaram muito abaixo da normalidade para o período, as altas temperaturas contribuem para o aumento no consumo de energia, agravando a situação. Os reservatórios das regiões sul e sudeste estão com suas reservas comprometidas, caso a estiagem se prolongue por mais tempo. As usinas termoelétricas foram acionadas e trabalham a todo vapor para suprir parte da demanda, num momento delicado para o setor. Nem o governo nem o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) podem afirmar com precisão as causas da interrupção. As informações são desencontradas e variam de sobrecarga na rede a raios que poderiam ter atingido as redes de transmissão.
O secretário executivo do Ministério de Minas e Energia garantiu que o “sistema trabalha com tranqüilidade, dentro do equilíbrio estrutural normal entre oferta e demanda”. Foi uma tentativa de arrefecer os ânimos diante do turbilhão de problemas provocados pelos freqüentes apagões, mas o inexplicável ficou mesmo sem explicação convincente. Até a presidenta resolveu defender a causa, garantindo peremptoriamente que as interrupções recentes não foram provocadas por raios, mas por motivos ainda desconhecidos. Melhor seria deixar o assunto para os técnicos da área, responsáveis por assumir as falhas e justificar as inconsistências que atingem o setor. Opiniões pessoais desprovidas de argumentos só alimentam boatos sobre a realidade dos fatos.
Como o caso é recorrente não há como negar a precariedade do sistema. Mesmo considerando o aumento da demanda, é evidente que os investimentos em transmissão de energia são totalmente insuficientes. O sistema interligado que teoricamente deveria suprir a demanda em outras regiões durante uma eventual falha vem demonstrando toda sua fragilidade. O Brasil tem necessidades urgentes de aportes significativos nessa área sensível, porém ainda carece de uma política energética definida que contemple uma projeção econômica com uma antecedência de pelo menos 30 anos. É o mínimo a esperar daqueles que se atropelam com as desculpas de sempre, mas deixam a desejar nos projetos de implantação de novas linhas de transmissão ou subestações robustas que garantiriam a estabilidade necessária ao sistema.
É evidente que as carências do sistema elétrico brasileiro remontam a décadas de letargia das empresas de energia, tendo como conseqüência imediata a prestação de serviços de qualidade questionável. Há muito as concessionárias subestimam o consumo e o crescimento econômico, deixando uma lacuna nesse segmento. Porém, há que se tentar recuperar o tempo perdido ou pelo menos amenizar o sofrimento do cidadão, completamente à mercê da indiferença daqueles que por dever de ofício, têm a responsabilidade em promover o bem estar coletivo. Pouco importa se as interrupções são causadas por sobrecarga na rede, incêndios florestais, ruptura da fiação, quedas de torres, raios ou qualquer fator externo. O que conta é a capacidade do sistema em superar as eventualidades com a segurança necessária, requisito básico para a tranqüilidade da população. E se a causa desse recente apagão foi mesmo uma descarga elétrica, qual o problema? Raios caem naturalmente por todo lado. Um erro não justifica o outro. Se não fazem o dever de casa, a culpa não é da natureza. Não é mesmo, senhora presidenta?
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(*) José Luiz Boromelo, escritor e cronista.

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