Paternalismo inconsequente

De José Luiz Boromelo:
mapa-do-brasilOs sinais de que a capacidade de endividamento do brasileiro está chegando ao seu limite são evidentes. Comerciantes reclamam de vendas fracas e do comportamento ressabiado do consumidor. Mesmo diante de campanhas publicitárias milionárias não se vislumbram mudanças em curto prazo. A conhecida lei da oferta e da procura impõe suas regras e determina o sucesso de qualquer atividade comercial, regulando naturalmente o mercado. Ocorre que alguns segmentos são tradicionalmente mais suscetíveis às oscilações na economia. As dificuldades no setor automotivo são apenas uma mostra do que vem pela frente. Mais uma vez as montadoras buscam o socorro do governo com o pires na mão. Como em outras incursões bem sucedidas ao Ministério da Fazenda, se fazem acompanhar do argumento manjado das demissões iminentes por conta dos pátios lotados, com o estoque de veículos superior a 60 dias de vendas. Esse tipo de pressão se tornou freqüente no momento em que os anteriormente contemplados com medidas protecionistas não conseguem desovar a quantidade absurda de veículos produzidos no País.
Ao invés de estimular a produtividade e a eficiência em suas linhas de montagem reduzindo seus custos finais, as montadoras buscam a proteção paternalista de um governo submisso e incompetente, que não consegue gerenciar com o mínimo de lucidez essa e outras questões relevantes. O resultado final é desastroso para uma economia cambaleante, agravado pelo PIB ridiculamente minúsculo e pela balança comercial deficitária. Seria razoável dedicar a mesma atenção a outros setores como o segmento do agronegócio, cujos números superlativos alavancaram sobremaneira a economia no último ano. Não basta apenas a dilação dos prazos de financiamento para máquinas e equipamentos agrícolas a juros atrativos. Se a intenção do governo for a de promover crescimento econômico, pois que tenha a iniciativa de subsidiar os insumos para a produção de alimentos. O agricultor brasileiro é penalizado injustamente com reajustes freqüentes nos preços dos defensivos e fertilizantes (que são atrelados à cotação da moeda norte-americana), onerando significativamente o custo de produção.
Esse é apenas um dos exemplos da invejável incapacidade administrativa de nossos governantes. O País sofre há muito com as carências na área de infra-estrutura. Rodovias em péssimo estado de conservação, portos sem competitividade, a opção equivocada pelo modal rodoviário (notadamente mais dispendioso que o ferroviário e o hidroviário) emperram o desenvolvimento. As dificuldades são observadas rigorosamente em todos os segmentos, portanto não se justifica o indecoroso privilégio destinado (novamente) a um setor específico. A prática de atacar os efeitos e não as causas dos problemas remontam a governos anteriores. Na contramão dos países desenvolvidos que sabiamente impõe valores elevados para o licenciamento e até o recolhimento de veículos com certo tempo de uso, por aqui se admite (por omissão, incompetência ou deficiência na fiscalização) o trânsito de verdadeiras carroças motorizadas, chegando ao cúmulo da isenção do imposto devido para veículos mais antigos.
Muito antes de oferecer ajuda para superar a crise sazonal do setor automotivo, o governo tem a responsabilidade de implementar medidas visando retirar definitivamente de circulação veículos sem condições de uso ou que ofereçam riscos aos usuários do sistema, mediante indenização prévia. Seria uma entre diversas iniciativas plausíveis para se amenizar a situação caótica de nossas vias públicas. Infelizmente, sabe-se de antemão que nada disso será viabilizado, pois depende diretamente da vontade política dos ocupantes do poder que a rigor não se arriscariam em perder seus confortáveis assentos nas Casas de Leis ao aprovar medidas polêmicas. A única certeza é a de que essa história tem seu início, meio e fim bem conhecidos. E quem paga conta é o esfolado contribuinte. Mais uma vez.
___________
(*) José Luiz Boromelo, escritor e cronista.

Advertisement
Advertisement