Um dia para esquecer

padreorivaldoDo padre Orivaldo Robles:
A derrota por 7×1 para a Alemanha, terça-feira passada, a mais humilhante de uma semifinal de Copa do Mundo, fez lembrar episódio que, lá na minha infância, ouvi de Padre Edwin Smeets. De 6 de março de 1953 a 27 de dezembro de 1957, estudei no seminário de São José do Rio Preto (SP), dirigido por padres holandeses. Nesse período houve a Copa de 1954, da fatídica “batalha de Berna”, Suíça, em que sofremos aqueles 4×2 a nós impostos pela Hungria de Grosics, Czibor, Kocsis, Bozsik e, acima de todos, de Puskas, lenda do futebol mundial.
Em 1950, ano do “maracanazo”, o Brasil já dispunha de apreciável valor futebolístico. Prova-o a construção do Maracanã, então o maior estádio do mundo. Estados Unidos, Canadá, Caribe e América Central não tinham futebol de expressão, mas Europa, América do Sul e México recebiam times brasileiros, que por lá excursionavam colhendo excelentes resultados.
Após a Segunda Guerra, com a retirada dos alemães invasores, a Holanda procurou reorganizar sua vida. Em seguida, teve que reforçar os diques para conter a invasão do mar. Quase toda a sua costa situa-se no mesmo nível do Mar do Norte ou abaixo dele. Mais que praticar esporte era preciso defender a vida do povo. Entende-se, pois, que antes dos anos 50 não houvesse grande futebol na Holanda. É aí que entra o caso contado por Padre Edwin:
Um time brasileiro (ele não recordava qual), em excursão pela Europa, jogou contra equipe holandesa de Amsterdã, Roterdã ou Haia. Na época, jogar futebol era costume de brasileiro; holandês usava tamanco de madeira. Os brasucas foram marcando gols, um atrás do outro. Perto dos 10×0, ainda no primeiro tempo, relaxaram. Começaram a fazer firula, tocar de letra, brincar com a bola. Padre Edwin contava que o capitão holandês chamou o colega brasileiro e o espinafrou: “Vocês vieram jogar futebol, não fazer palhaçada. Joguem com seriedade. Nós não somos moleques. Pouco importa se viermos a perder de 20 ou 30”. Smeets não soube dizer como terminou a partida.
Que sorte a nossa, hein! Já pensaram se David Luiz repreendesse Philipp Lahm como fez aquele capitão de time holandês? Em vez de 7×1, levaríamos 15 ou 20. Sim, porque os alemães tiraram o pé. Não acreditaram no que viam. Era como bater em bêbado. Aos 30 minutos do 1° tempo, já ganhavam por 5×0. Aonde ia parar? Passaram a jogar em ritmo de treino. Se jogassem a sério, estaríamos tomando gol até hoje.
A Copa de 2014 devia levar-nos a superar o desastre de 1950. Conseguiu. O desastre, desta vez, foi pior. Vai levar mais de 64 anos para esquecermos. Fora dos gramados, lindo exemplo: sem dinheiro para os caros ingressos da Fifa, nosso povo acolheu os visitantes com simpatia e carinho. Dentro de campo, caricatura do futebol brasileiro desde o jogo de abertura. Claro que a Fifa, a CBF, a Globo e patrocinadores não admitem. São abutres famintos; fartam-se de ganhar dinheiro às nossas custas.
Mais que técnico e jogadores, culpa tem a camarilha que, há décadas, comanda a CBF. Que só tem olhos para os próprios bolsos. Perdeu a noção do futebol de hoje. Crê que ainda somos os melhores do mundo. Melhores em quê? Em ganância, em negociatas, em vaidade, em mania de grandeza? Bons resultados só se obtêm com competência, trabalho e honestidade. Será que, um dia, a CBF acreditará nisso?

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