Morre Joaquim Dutra

Joaquim Dutra

Morreu nesta noite, em Maringá, o empresário Joaquim Dutra, 86. Ele foi fundador da TV Cultura (hoje, RPC) e de O Diário do Norte do Paraná, tendo trabalhado na primeira emissora de rádio da cidade (Cultura) e na Folha do Norte. Paulista, formado em Contabilidade, ele era considerado o Roberto Marinho de Maringá, segundo Luiz de Carvalho, pois tornou-se sócio de Samuel Silveira num grupo de 13 emissoras de rádio em várias cidades do Paraná. Ele estava doente havia alguns anos; sua mulher, dona Luíza, faleceu em 2010. Ele presidiu a Acim na 9ª gestão (1968-1969). O velório começará às 7h desta segunda-feira, na salão nobre da Capela do Prever da Zona 2.
Sobre Dutra, escreveu Ademar Schiavone, em 2012, no Jornal do Povo

“Ele chegou à cidade, jovem e dinâmico, quando a Avenida Brasil era uma picada em meio à mata fechada e as primeiras casas eram erguidas no chamado Maringá novo.
Montou um hotel que servia aos milhares de aventureiros que vinham para o norte do Paraná tentar e fazer a sorte, como fez os pioneiros.

Joaquim Dutra conheceu no seu hotel, que tocava com os pais e o irmão Zé Dutra, um sonhador chamado Samuel Silveira que aportou na cidade com o desejo de montar uma estação de rádio e já trazia embaixo do braço, a licença.

Como o Joaquim tinha uma excelente voz e um desejo enorme de crescer, ficou sócio do Samuel antes de começar a montagem.
Nasceu a Rádio Cultura de Maringá. O estúdio e o escritório na avenida XV de Novembro na esquina com a Herval. O transmissor, onde é hoje a Reitoria da UEM. A lincagem entre o estúdio e o transmissor, era feita por um fio elétrico esticado sobre paus fincados pelo caminho.

Na verdade eles contaram com a paciência e a competência de um técnico de som dos melhores que conheci na vida: Francisco Dias Rocamora.

Depois de muitos meses, finalmente em 1952, no mês de abril, aconteceu a primeira transmissão.

O Joaquim, o Samuel e já junto o Carlos Piovezan, que acabou sócio também, eram tudo: vendiam propaganda, faziam os anúncios, tocavam música. O Joaquim o locutor, claro.

A Cultura cresceu rapidamente. Precisavam de uma secretária. Ela veio: Luiza Lemos. Rapidinho começou o namoro e o Joaquim casou-se com a Luiza.

A emissora cresceu, firmou-se sempre seguindo a linha traçada por eles: honestidade, competência, vigor no que fazer, mas sempre respeitando o direito dos outros.

O Samuel que tinha excelente trânsito no governo federal foi criando novas emissoras: a rádio Jornal em Maringá e mais quinze outras espalhadas pelo estado. O Samuel era o presidente, o Joaquim o superintendente, o Carlos o diretor financeiro e o Rocamora o diretor técnico.

Cresceram muito e formaram a maior rede de rádio do Paraná: A rede paranaense de rádio, a maior força de comunicação do Estado.

Eram fortes e respeitados. Bajulados por políticos numa época em que o rádio era o maior veículo de comunicação que existia, souberam manter-se sempre longe das benesses do poder e jamais se curvar para ninguém.

O Joaquim Dutra sempre foi especial.
Em 1959 comecei a trabalhar na Cultura, como cronista social. Depois como comentarista esportivo e finalmente gerente da emissora. Aprendi muito com eles, principalmente com o Joaquim e ficamos amigos, amizade que eu prezo e respeito muito.

Quando Dom Jaime resolveu deixar a Folha do Norte, Joaquim arrendou o jornal e fez um belo trabalho, tendo o Antonio Augusto de Assis, como redator chefe. Deixando a Folha fundou o O Diário do Norte do Paraná. Também não era a sua seara. Acabou vendendo-o para o Frank Silva, que o transformou num dos mais importantes órgãos de imprensa do estado.

Quando Samuel Silveira conseguiu junto com Dom Jaime e vários outros empresários, a concessão de um canal de TV, o Joaquim estava junto. Nasceu a TV Cultura.
Não foi o forte do Joaquim. Continuou se dedicando ao rádio, com a competência que sempre teve e onde era a sua seara.

Em fins da década de 60 o governo criou uma lei reduzindo o número de emissoras que um grupo poderia ter, para apenas sete. A Rede Paranaense de Rádio começou a ser desmanchada. Uma a uma, as emissoras foram sendo vendidas. A primeira foi o Aloizio Barros quem comprou, em Nova Esperança.

O Samuel e o Joaquim tinham um lema: vender primeiro para os funcionários que o ajudaram a crescer.
E assim aconteceu.
Quando colocou Paranavaí a venda, eu queria comprar.

Não tinha o dinheiro necessário. O Joaquim fez a proposta: 30 mil de entrada e pagamentos mensais, em 4 anos, crescendo a cada ano. Fiquei assustado com as prestações. Ele foi decisivo: .
Graças a Deus, não precisou. O dinheiro da entrada o Santana gerente do Bradesco, e o Josué Moraes, gerente do Itaú, arrumaram, com o aval do Walter Steiner e do Jitsuji Fujiwara. Paguei todas em dia.

Ele fez isso com todas as emissoras que vendeu.
Já dono de rádio, viajamos juntos para Curitiba para fazer a renovação da licença. No Landau novo que o Joaquim tinha comprado o Aloizio Barros, o Carlos Piovezan e o José Sanches Filho. Num quebra-molas dentro de Apucarana, um fusca passou pela gente e foi embora.

O Barrinhos estrilou: O Joaquim nem se abalou. Tranqüilo como sempre, continuou na velocidade máxima de 80. “ Ele tem razão em estar com pressa. Precisa ganhar dinheiro para comprar um Landau. Eu já tenho”. Sempre respeitou a lei e as pessoas.

Embora não fosse político, sempre a Cultura apoiou alguém nas campanhas municipais e para deputado. E o que é importante: de graça. O apoio era sempre dirigido aos que tinham condições de melhor representar os anseios da população.

Em 1982 Ferrari Junior era a maior audiência da cidade, com um programa chamado Tribuna do Povão, ao meio dia, na rádio Cultura.

O Ferrari, por razões que desconheço, estava inimigo do prefeito João Paulino que o elegeu o vereador mais votado, nominalmente, da história da cidade.
JP acabou candidato a vice-governador na chapa de Saul Raiz. O Ferrari era contra e batia forte. O JP me chamou e determinou: <é preciso tirar o programa do Ferrari do ar, custe o que custar>

Fui conversar com o Joaquim Dutra. A princípio não quis papo. Com a argumentação de que a candidatura do João Paulino era importante para Maringá, ele acabou cedendo. Cai na besteira de perguntar quanto custaria a retirada do programa. O Joaquim ficou uma fera. Não estava fazendo isso por dinheiro, mas sim pelo que representava o JP para Maringá.

O Ferrari saiu do ar, mas acabou elegendo-se deputado estadual pelo PMDB.
Naquela eleição, à última hora, acabei candidato a prefeito numa sublegenda do PDS. O Joaquim e a rádio Cultura me deram um apoio logístico fantástico, mesmo sendo eu dono da rádio Atalaia.

Quando fui eleito governador do Lions, morava em Paranavaí. A primeira pessoa não pertencente ao Lions a me cumprimentar foi o Joaquim. Fiquei sensibilizado pelo carinho demonstrado pelo amigo. Embora fosse dono da rádio Paranavaí, numa gentileza do Joaquim usei em todos os conselhos distritais e nas grandes reuniões leonísticas daquele ano, o som da rádio Cultura que era o melhor do Paraná.

O Joaquim Dutra sempre foi um homem especial: culto, inteligente, cortês, capaz. Fez do rádio a sua razão de viver. Fez o melhor que o rádio do Paraná já produziu.

Aprendi muita coisa com ele, principalmente que o radialista, por ser conhecido de todos, é popular e por isso mesmo, deve saber respeitar os outros jamais usando o microfone em benefício próprio.

E mais: rádio vive de anúncio e não de verbas públicas.
Joaquim Dutra é mais que um bom sujeito: é um ótimo sujeito”.

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