Terra de sujismundos

Sujismundo

De José Luiz Boromelo:

“Povo desenvolvido é povo limpo”.
Esta frase marcou uma campanha promovida pelo governo militar no ano de 1972, em que estimulava a mudança de comportamentos visando uma melhor qualidade de vida, especialmente na correta destinação do lixo, um problema que já se mostrava preocupante à época.

Não obstante a iniciativa fazer parte de um conjunto de medidas que buscavam transmitir um falso otimismo com viés ufanista (assim como os slogans “Este é um País que vai pra frente”, “Brasil, ame-o ou deixe-o” e “Ninguém segura este País”), em contraposição a uma imagem de um governo desgastado e povo com alto índice de analfabetismo e subdesenvolvimento, a série de quatro desenhos animados de curta duração agradou em cheio a adultos e crianças. O personagem Sujismundo, que incorporou o estigma do ecologicamente incorreto por sua excessiva ingenuidade com relação ao tema, acabou atraindo naturalmente a simpatia das pessoas.
Saudosismos à parte, as cenas da atualidade impressionaram. Nas comemorações da virada do ano e na ressaca do Carnaval foi possível constatar o nível de comprometimento do brasileiro com a qualidade de vida da coletividade. No mais famoso cartão postal do País sobraram montanhas de lixo, recolhidas por uma força-tarefa motorizada, no intuito de proporcionar um ambiente pelo menos aceitável para os freqüentadores e turistas. As praias do Rio de Janeiro viraram um lixão a céu aberto, transformadas em depósito de tudo o que se possa imaginar, quando o assunto são os resíduos sólidos produzidos pelo ser humano. O “privilégio” em ter suas vias e logradouros públicos emporcalhados pela sujeira não se restringiu somente aos cariocas “da gema”. Em determinado município do noroeste paranaense e cercanias, a impressão é de que a legislação ambiental inexiste ou não alcança os que a afrontam, ou ainda que os órgãos de fiscalização não cumprem com suas atribuições como deveriam. A constatação de que uma parcela da população continua a despejar lixo por todo lado é evidente e que as campanhas governamentais de alerta contra a proliferação de moléstias contagiosas não têm surtido o efeito esperado, apesar do empenho das autoridades da área de saúde. A dura realidade mostra que, quarenta e quatro anos depois, ainda não somos limpos o suficiente e muito menos desenvolvidos. Continuamos como País de terceiro mundo, espalhando por todo lado as lembranças da ignorância e do descaso.
É de causar tristeza e indignação o comportamento de determinadas pessoas. Fundos de vales, estradas rurais, vias de pouca movimentação, praças, calçadas, enfim, o que menos importa é o local escolhido para a prática altamente danosa ao meio ambiente e à saúde da população. De nada adiantam os pedidos e recomendações dos órgãos públicos, quando o mal educado resolve se desfazer de suas tralhas. A ousadia acompanha os descompromissados, fazendo com que os mutirões de limpeza sejam cada vez mais frequentes. A fiscalização rigorosa e a veiculação de campanhas educativas permanentes na mídia seriam os primeiros passos para tentar diminuir essa prática condenável, inclusive com a aplicação de penas pecuniárias e a abertura de ações penais contra os infratores da legislação vigente. Em tempos de Aedes Aegypti, todo cuidado é pouco. A vigilância deve ser diária para se evitar a proliferação do inimigo número um da população. Até mesmo o renascimento do simpático Sujismundo, atualizado e devidamente intelectualizado seria muito bem-vindo. Nessa época de conectividade virtual, o famoso personagem certamente faria sucesso, “bombando” nas redes sociais, uma ajuda e tanto no universo de milhões de usuários da Internet, mesmo sendo copiado de uma época para ser esquecida. Vale tudo por uma boa causa.
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(*) José Luiz Boromelo, escritor e cronista

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