Os imperdoáveis

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Por José Luiz Boromelo:

O País inteiro assistiu incrédulo, ao vivo e em cores uma das maiores demonstrações de incivilidade protagonizada por nossos representantes da Câmara Federal.
Na sessão de votação da admissibilidade para o prosseguimento do impeachment da presidente da República, os deputados federais mostraram o que são, na verdade: um bando de indisciplinados, mal educados e totalmente descompromissados com as responsabilidades a eles atribuídas.
Apesar de cientes do tempo de 10 segundos para a destinação individual do voto, estipulado previamente pela presidência da Casa, muitos dos parlamentares aproveitaram os holofotes para brindar os presentes e os telespectadores com as mais esdrúxulas iniciativas. Aconteceu um pouco de tudo naquele recinto, supostamente um espaço democrático que haveria de ser respeitado, independente de convicções político-partidárias.
Até pela gravidade do tema a ser votado, os sentimentos dominantes nos deputados haveriam de ser os de circunspeção, comedimento, respeito e acima de tudo, civilidade, o que, aliás, é apenas e tão somente uma obrigação do parlamentar, quando se relaciona com seus pares. Mas o clima libertino de festa dominou aquela melancólica sessão, contaminando a quase totalidade dos representantes do povo. Salvo raríssimas exceções, as demonstrações de imaturidade política e despreparo para o exercício do cargo se sobressaíram, expondo a péssima qualidade dessa legislatura e revelando, sem pudores, as entranhas daquela centenária instituição. O festival de aberrações incluiu apupos, berros, cusparadas, acusações mútuas, empurrões, gesticulações agressivas e xingamentos dos mais variados possíveis. Mas o que chamou a atenção em particular, foram as dedicatórias emocionadas a familiares, amigos, protegidos políticos e colaboradores. Muitos fizeram questão de invocar a proteção divina, como se o Criador estivesse realmente com os olhos voltados para as mazelas dessa classe completamente desacreditada. Até os papagaios de pirata deram seu show particular, acenando para as câmeras, acotovelando-se para um melhor enquadramento.
Foram várias horas de tortura, até que o presidente da Câmara deu por encerrada a sessão. O melancólico e deprimente espetáculo circense finalmente chegara ao seu fim. O inexplicável rancor destilado pelos que ocupavam o microfone oscilava entre a presidente da República e o presidente da Câmara, que se manteve impassível ante as incontáveis acusações. Perdeu-se totalmente o foco, enquanto a plateia ovacionava cada voto como se estivessem em uma decisão por pênaltis no jogo final do campeonato. Insensíveis, inconsequentes e hipócritas ao extremo, os parlamentares provaram o quão distantes estão da verdadeira democracia. Não faltou nem o palhaço, contaminado pela baderna reinante, fazendo sua graça sem graça alguma naquele momento tão importante.
Certamente o cidadão comum teve a oportunidade de avaliar melhor seus representantes. Ficou a certeza da necessidade urgente de renovação, diante daquele espetáculo dantesco. Outra constatação inequívoca saltou aos olhos da sociedade: há que se repensar sobre a necessidade de tantos partidos políticos no País, enquanto detentores das decisões de seus filiados investidos em cargos eletivos. Alguns parlamentares fizeram questão de justificar sua decisão, por conta da imposição das legendas. Nossos deputados perderam uma chance de ouro para provar que são realmente merecedores dos votos que receberam. Pisaram feio na bola. No próximo pleito eleitoral, não terão nosso perdão.
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(*) José Luiz Boromelo, escritor e cronista

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