Quero ser presidente

Faixa presidencial

Por José Luiz Boromelo:

Também quero ser presidente. Esse cargo deve proporcionar somente coisas boas. Essa foi a impressão que os parlamentares federais transmitiram à nação, por conta da eleição do novo presidente da Câmara dos Deputados.
A movimentação em torno da escolha daquele que conduzirá os trabalhos até o início do próximo ano suscita algumas análises aparentemente simplistas, porém não menos interessantes. Foi de longe a disputa mais concorrida daquela Casa Legislativa, com uma dezena e meia de candidatos pleiteando o posto.

Sabe-se que as mordomias inerentes ao cargo são escandalosamente generosas (residência oficial, seguranças, transporte aéreo à disposição, um capilezinho a mais no final do mês, além é claro, do status e do poder de influência nas votações do plenário) e pelo menos para a maioria dos postulantes “pára-quedistas”, a aventura garantiu os minutos de fama em rede nacional de rádio e televisão.
Como a presidência de instituições daquele naipe é realisticamente inalcançável para minhas humildes aspirações, haverei de me contentar com algo um tanto mais modesto, que esteja ao nível das limitações comuns a todo o cidadão (que direciona suas preocupações para o malabarismo diário de tentar equilibrar o orçamento, ansioso pela chegada do fim do mês). No máximo, o ápice de meus devaneios se daria com o exercício da vereança, sendo essa possibilidade bem mais plausível para alguns (ainda não ouso me incluir nesse rol, até porque sinto verdadeira ojeriza pelo palavreado meloso, empolado e pretensamente erudito dos nobres pares, geralmente acompanhado de segundas ou terceiras intenções) dispostos a doar seu tempo e suas energias em prol da coletividade. Ainda assim, proporcionalmente ao número de eleitores, a constatação é a de que poucos são os contemplados (verdadeiramente imbuídos de boas intenções para o exercício dessa justa causa). Então, pensei em procurar alguma entidade organizada que me aceite como presidente. E como é de praxe que os escolhidos para essa função sejam integrantes da própria instituição, acabo automaticamente excluído dessa improvável lista.
Mas nem tudo está perdido. Ainda tenho esperanças de, em um abençoado dia, presidir alguma organização um pouco menos influente na sociedade, como uma associação recreativa familiar, um clube de leitura ou de enxadristas amadores, um grupo de pedestrianismo noturno (desde que os deslocamentos sejam adequadamente sinalizados), uma tropa de cavalgadas dominicais (sem o consumo de bebida alcoólica), uma escolinha de empinar pipas (em locais apropriados), uma roda de violeiros e sanfoneiros ou algo parecido. Tudo dentro dos conformes, com estatuto, livro ata e lista de presença, entre outras particularidades. E se nada disso der certo, só me resta como consolo criar minha própria agremiação, em que ocuparei, além da presidência, a vice-presidência, a primeira secretaria e até a tesouraria. Sem conflitos, sem divergências. Mas aí não teria graça nenhuma. O bom do negócio é o debate, sereno e sensato. Sem troca de favores, de promessas de cargos, de “toma lá, dá cá”, sem jogadas sujas de bastidores, apenas lastreados em argumentos. Oxalá algum dia possamos realmente ver nossos representantes honrando o mandato para o qual foram eleitos. Sem se portar como gladiadores no plenário. Sem decretar vergonhosamente o “recesso branco” (a pigmentação mais adequada nesse caso seria a esverdeada, a mesma das garoupas que certamente nadarão tranquilas para dentro de suas algibeiras, sem descontos dos dias ociosos). Sem assumir posturas fisiológicas, determinadas por um partido político. Quero sim, ser presidente. Pode até demorar um pouco. E meus futuros correligionários deverão preencher alguns pré-requisitos deveras importantes, que tem o poder de aglutinar pessoas: a retidão de caráter e o respeito ao semelhante. Coisa rara nos políticos brasileiros ultimamente.
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(*) José Luiz Boromelo, escritor e cronista

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