Prato típico de político

Câmara

Por José Luiz Boromelo:

Vereadores maringaenses aprovaram em primeira discussão o projeto de lei que institui o lanche tradicionalmente conhecido como “cachorrão”, como o prato típico da Cidade Canção. Sem entrar no mérito da questão, até pela necessidade imperativa de reconhecimento e respeito à multiplicidade de paladares de seus habitantes, se torna impossível manter a indiferença ante um tema tão “sui generis” como esse.

Justamente no momento em que o País atravessa momentos delicados nas áreas institucional, econômica e política, em que a probidade da figura do homem público é colocada em questão, os nobres edis resolvem levar adiante essa iniciativa no mínimo dispensável e extemporânea, para não dizer excêntrica. A evidente falta de percepção das reais necessidades da sociedade expõe sem disfarces a miopia social que acomete determinados representantes do povo, enquanto detentores de cargos eletivos e legítimos defensores dos direitos da sociedade.
Nessa perspectiva, a população poderia suscitar questionamentos pertinentes a serem direcionados aos protagonistas em questão, uma vez que o tema gastronômico foi considerado de relevância, em detrimento a outros assuntos que certamente afetam diretamente a vida do cidadão. Como o polêmico debate sobre o transporte coletivo, suas deficiências, necessidades, qualidade dos serviços ofertados, grau de satisfação do usuário (amplamente noticiado por diferentes meios de comunicação); a controversa demora na remoção de árvores classificadas como condenadas pelos órgãos responsáveis, causadoras de transtornos e prejuízos consideráveis, especialmente em épocas de chuvas e vendavais, por conta da exuberante arborização do município; a falta de políticas públicas que ofereçam alternativas eficazes para a melhoria da fluidez do trânsito urbano, demasiadamente sobrecarregado pelo ônus em acolher um superlativo volume de tráfego oriundo da região metropolitana, agravado pela disponibilidade específica de bens e serviços na região central (incluindo-se ainda nesse rol a falta de vagas de estacionamento e a submissão involuntária e compulsória dos condutores aos famigerados autointitulados “guardadores de veículos”); as dificuldades encontradas pela administração municipal no tocante à manutenção satisfatória do pavimento de vias públicas, um problema recorrente verificado em absolutamente todas as gestões, motivo de transtornos intermináveis aos usuários; outras demandas e necessidades enfrentadas pela população (como a frequente falta de vagas nas creches municipais, ou as dificuldades na área da saúde), costumeiramente lembradas pelos políticos somente em épocas de campanhas eleitorais; enfim, uma gama considerável de assuntos tão distintos quanto imprescindíveis para o bem estar da população, que obrigatoriamente haveriam de figurar diariamente na pauta da casa legislativa municipal, valendo-se do princípio de que o vereador é o defensor permanente e inconteste da causa pública, quando, no momento da posse, assume o juramento de legislar e fiscalizar. Sendo assim, a iniciativa em eleger o cachorrão como prato típico do município a princípio, deveria partir dos segmentos alimentícios relacionados àquela atividade econômica, por ser (em tese), assunto de interesse maior dessa classe. Dessa forma, os nobres pares teriam tempo e discernimento suficientes para o aprimoramento das atividades inerentes ao cargo que temporariamente ocupam, requisitos estes indispensáveis para uma perfeita interação do Poder Legislativo com os munícipes.
Por essa e por outras, o País marca passo no quesito desenvolvimento. Não só econômico, social político ou cultural. As consequências estão aí, a reafirmar a necessidade urgente de mudanças de atitudes por parte do eleitor. Para isso, é preciso deixar de lado a indiferença e a omissão, mesmo com a avalanche dos casos de corrupção envolvendo homens públicos. A participação efetiva do cidadão é fundamental para a consolidação de novas lideranças, com objetivos definidos, que venham de encontro com os anseios do cidadão. Sem deixar de saborear aquele apetitoso e democrático cachorro-quente, genuinamente maringaense.
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(*) José Luiz Boromelo, escritor e cronista em Marialva/PR

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