O Novo Centro Cívico e a velha prática

(Pelo artigo abaixo dá para se entender as mudanças que estão prestes a serem feitas por SM Silvio II para beneficiar o grande Jefferson Nogaroli, eminência parda da política maringaense, elo entre os Barros e os Verri, e o irmão mais novo, e mais esperto, no empreendimento na área do antigo aeroporto – coisa de bilhões, sendo R$ 30 milhões um pingo d´água no oceano)

Da professora Ana Lúcia Rodrigues:
O Conselho de Planejamento e Gestão Territorial de Maringá está apreciando uma mensagem de lei que o prefeito municipal enviará à Câmara criando a “Zona Especial 16 – Centro Cívico”. A proposta integra duas áreas: uma pública de propriedade da União, com 33 alqueires, local onde funcionava o aeroporto, e outra, privada, com 31 alqueires, de propriedade particular.

Antes de analisar se essa lei é importante ou não para a população de Maringá, cabe contextualizar essa ação no âmbito que historicamente associa o poder público e o empreendedor privado.
Isso se insere na prática recorrente em todas as cidades brasileiras, que consiste no acesso facilitado aos fundos e bens públicos pelos investidores privados. Cabe ressaltar que em Maringá e região, essa prática tem rendido vultosos frutos para o empreendedor privado.
Vale lembrar, por exemplo, que a Companhia comprou do Estado grande parte do território norte do Paraná e pagou 20 centavos por cada alqueire. Todavia, esse preço baixo não foi repassado aos moradores que para cá vieram. Maringá nunca priorizou o oferecimento de condições de moradia aos que não podiam pagar caro pela terra.
Temos a reedição de tal prática nesse momento em que o gestor público municipal legisla em prol do interesse privado e em detrimento do interesse público.
O caráter público e coletivo do parcelamento do solo no antigo aeroporto e seus arredores estaria assegurado se o prefeito municipal conseguisse que a União concedesse parte do terreno para atender, por exemplo, à necessidade de construir habitação de interesse social, a fim de que os maringaenses pudessem adquirir por meio do Minha Casa, Minha Vida uma residência naquele local, na Maringá cantada em verso e prosa e não nas bordas distantes da Cidade Canção.
Desde que as cidades se tornaram (segundo Peter Hall) “máquinas de produzir riqueza”, o planejador urbano se confunde com o empreendedor e muitos gestores municipais (como nos ensinam Arantes, Maricato e Vainer) deixam de ser dirigentes políticos e se tornam vendedores ambulantes de cidades mercadoria, ávidos por atrair investimentos e moradores com dinheiro.
Os discursos que estamos ouvindo mostram exatamente isso, pois proclamam a ousadia e a gigantesca proporção do projeto, destacam a utilização da área como agregadora de valor à cidade, afirmam que “trazendo aposentados de alta renda, que não dependem do poder público, tem um efeito que melhora o consumo de todo o comércio, e já volta gerando empregos e renda (…) fora a atração de massa de inteligência porque são empresários, juízes que querem morar em Maringá”.
O que se divulga é que essa lei propiciará a implantação de um megaprojeto urbano, que consiste em “um empreendimento imobiliário associado ao poder público que pode alterar o desenvolvimento urbano de Maringá”. Tenta-se dar legitimidade atribuindo ao empreendimento o falso papel de ser excelente para toda a cidade e para todos os maringaenses, considerando que é moderno e alicerçado em um projeto arquitetônico belíssimo, assinado por um escritório de notória excelência, assim como foi o projeto do Novo Centro, criado pelo extraordinário arquiteto Oscar Niemeyer.
É espantoso tentar legitimar algo que reproduz uma urbanização tão perversa e excludente. O que temos aqui é produção de injustiça urbana e social, pois se trata tão somente do velho modelo liberal em que o loteador, o incorporador privado, o construtor, enfim o agente do mercado imobiliário utiliza o megaprojeto com a chancela do poder público como chamariz para vender o seu empreendimento privado e, ainda, para auferir concessões referentes à flexibilização da legislação e/ou à implantação da infraestrutura urbana e social pelo erário.
Para evitar tais distorções é que a legislação produz parâmetros para que o uso e a ocupação do solo divida igualmente os ônus e os bônus da urbanização entre todos os cidadãos. O zoneamento do território objetiva oferecer diretrizes para a implantação das diversas funções urbanas: residenciais, de comércio e serviços, industriais, de proteção ambiental, rural e, ainda, as especiais.
O zoneamento objetiva “o bem-estar público”. A proposta de que as áreas privadas sejam incorporadas à “Zona Especial Centro Cívico” não se justifica sob nenhuma hipótese, pois uma zona especial deve se restringir a “atividades, usos ou funções urbanas de caráter excepcional”. O loteamento que o empreendedor fará nas áreas privadas não pode ser considerado de caráter excepcional sob pena do poder público conceder a um empreendedor privado benefício que todos os demais também poderão pleitear.

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* Pós-doutora em Urbanismo (FAU/USP), doutora em Sociologia Urbana (PUC/SP), coordenadora do Observatório das Metrópoles; professora e representante da UEM no Conselho Municipal de Planejamento e Gestão Territorial.

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