Os caminhos da democracia

De José Carlos Boromelo:
democracia01O brasileiro sempre buscou a democracia e a história mostra toda a dificuldade para prevalecer a vontade da maioria, mesmo que isso resultasse em conseqüências indesejadas. Assim foi nos episódios importantes que marcaram o País e mais recentemente no Movimento das Diretas Já de 1984 ou na deposição do presidente em 1992. Os sentimentos que moviam multidões nos tempos da repressão não eram apenas desejos de mudanças. Nos eventos muitas vezes reprimidos com violência se pleiteava o respeito aos direitos elementares do cidadão. Os manifestantes ocupavam as ruas para defender suas ideologias, que julgavam relevantes para a coletividade e tinham objetivos específicos (nem sempre compreendidos como legítimos), mas que resultaram em conquistas que perduram até hoje. Dessa época fervilhante e saudosista pouco restou. As reivindicações esfacelam-se diante da onda de selvageria que atinge o País. Na maioria dos protestos a marca registrada é a baderna, perpetrada por indivíduos infiltrados que se escondem no anonimato de um rosto encoberto. Como se uma máscara ou um pano qualquer concedesse a alguém o direito de depredar, furtar e agredir. Falta-lhes coragem e sobra covardia. Agem sempre em bandos, uma forma eficiente de dificultar a repressão. Nem de longe lembram os ativistas de outrora que se aglomeravam aos milhares e sentiam orgulho de entoar o Hino Nacional, uma demonstração inequívoca de patriotismo.
O incentivo à violência parece ter se espalhado pelo País. Um acontecimento qualquer já é motivo para se interditar uma via público. De móveis a pneus, lixeiras, orelhões, papéis, tudo serve de combustível para a intolerância incandescente de alguns exaltados. A baderna não provoca somente quilômetros de transtornos no trânsito e na vida das pessoas. Logo aparecem os agitadores mascarados e a destruição ganha reforços de peso, com os bandidos profissionais tomando a frente nos atos de vandalismo, dos quais são exímios executores. Os veículos de transporte coletivo são o alvo do momento. Ônibus são incendiados aleatoriamente como pretexto de inconformismo em relação a qualquer situação que venha a contrariar suas convicções antidemocráticas. Sentem prazer no dano ao patrimônio, como uma compensação pela própria condição de vida. Tentam impingir à sociedade e ao cidadão de bem a responsabilidade por suas frustrações pessoais e profissionais.
É visível nessas manifestações a presença de indivíduos determinados a insuflar as massas, previamente abastecidos com um arsenal diversificado e altamente contundente. Obviamente são financiados por gente sem escrúpulos, que têm interesse em transformar os manifestos (inicialmente pacíficos) em baderna. No episódio mais recente um cinegrafista foi atingido por um artefato explosivo que lhe causou a morte. A atual situação suscita questionamentos: onde estaria a verdadeira democracia? Acaso se percebe algum resquício dela quando pessoas resolvem destruir o bem alheio? Poder-se-ia vislumbrar democracia naqueles que tomam para si o direito de fazer justiça com as próprias mãos? Estaria presente em nossa paquidérmica Justiça, que com sua morosidade protelatória estimula o cometimento de ilícitos de todo tipo? Existe democracia para o esfoliado contribuinte que sofre com as carências em todos os setores (transportes, educação, saúde, segurança, serviços públicos), ou para as vítimas indefesas da violência urbana? Estamos diante de uma crise institucional e moral sem precedentes. A sociedade não aceita receber apenas “pão e circo”. Os caminhos para a democracia não se pavimentam com ações midiáticas e eleitoreiras, mas com seriedade no trato com a coisa pública. Democracia é o reflexo do empenho permanente na promoção de justiça social. Coisa que político brasileiro ainda não aprendeu.
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(*) José Luiz Boromelo, escritor e cronista.

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