A arte de transformar reputações em cinzas

andre1Sou jornalista há três décadas e já assisti muitas reputações arderem em praça pública, de políticos, na maioria. Pessoas que são imoladas pela opinião pública muito antes de receberem uma intimação para prestar esclarecimento sobre pequenos ou grandes crimes. O jornal divulga documentos que deveriam ser sigilosos, faz ilações, liga alguns pontos a outros e pronto: está criado um réu, estabelecido um corpo de jurados e dada a sentença. A pressa em acender o pavio é tanta que os rituais jurídicos ou éticos viram cinzas na mesma velocidade em que o acusado se encolhe e desaparece da cena. O caso do deputado André Vargas é bastante ilustrativo desse processo. Sem entrar no mérito da culpa pela amizade com doleiro que exibe vasta ficha criminal – e usufruir dessa proximidade num nível muito suspeito -, o parlamentar acabou enredado na teia que ele próprio teceu, não sem ganhar ajuda providencial de alguém que ‘deixou’ vazar informações até então sigilosas sobre uma investigação da Polícia Federal. Antes que me acusem de simpatizante da causa, lembro de outro episódio devastador, envolvendo o secretário-geral da Presidência, Eduardo Jorge, então a serviço de Fernando Henrique Cardoso. Acusado de envolvimento em lobby e superfaturamento na construção do fórum trabalhista de São Paulo, como foi amplamente divulgado pela imprensa segundo o mesmo ritual apressado e atropelador de reputações, passou quase uma década tentando provar sua inocência – e conseguiu. Obteve o direito a indenização de veículos de imprensa e do ex-tudo Ciro Gomes, quem primeiro o acusou de corrupto em 2000. Acredito que EJ, como era chamado, é inocente, pois assim se pronunciou a Justiça. Não sei até onde vai a culpa de André Vargas, que caiu ao voar de graça num jatinho-bandido. Imagino que a ficha de delitos seja grande, mas isso não importa. Virou ‘inimigo público’ e vai sair da cena política em desgraça. Assim que renunciar – se o fizer -, será imediatamente esquecido. Seu crime mais conhecido – e pelo qual caiu – não derrubou Renan Calheiros (presidente do Senado) e Henrique Alves (presidente da Câmara dos Deputados), igualmente acusados de se deslocarem para compromissos particulares usando aviões oficiais, da FAB, no caso. Não se falou mais no assunto. Mas viva a imprensa: seria bem pior sem ela, livre e desimpedida!
Edivaldo Magro

(*) Montagem com fotos de Alan Sampaio/iG e George Gianni/PSDB

Advertisement
Advertisement