Um padre na balada

Do padre Orivaldo Robles:
padreorivaldoFazia 73 anos que eu não entrava numa casa noturna. Dessas que organizam noitadas tão do gosto da nossa moçada baladeira. Pelo menos não entrava numa em funcionamento: gente elegante às pampas, som nas alturas, conversa aos gritos, bebida à escolha e à vontade, salgadinhos de fino gosto, essas coisas. Eu tinha estado numa, sim, faz tempo, mas de dia, junto com o proprietário, que lá me levou para dar uma bênção às instalações. Evidentemente, estava vazia àquela hora. Nem sei se ainda está em atividade. Estabelecimentos dessa natureza abrem e fecham com rapidez surpreendente.
A casa a que me dirigi, segundo fui informado, vem bombando na noite maringaense. Nunca tive curiosidade de saber o que fazem ou como se comportam as pessoas lá dentro. Quando comentei que, à noite, estaria lá, um jovem amigo pôs-se a troçar de mim: “O que, hein! Como as coisas mudam. Padre agora frequenta balada, é?”. Não exatamente. O que houve é que o diretor comercial do DNP pediu-me que lá comparecesse na noite do último dia 25 de junho para fazer uma oração de ação de graças e dar a bênção pelos 40 anos de existência do jornal. Só isso.
Fui acolhido com grande fineza. Ele mesmo veio receber-me e me encaminhou pelo meio da pista, que, àquela hora, já botava gente pelo ladrão. Gesto providencialmente necessário, diga-se. Eu não fazia a menor ideia da direção que devia tomar. Com firmeza e simpatia, fez-me passar entre os convidados, subir a escada até atingir o camarote (é esse o nome do balcão comprido que abriga o povo vip?). Agradeci e, aliviado, lá me posicionei, à espera do momento da minha fala. Um índio Tikuna do Amazonas, em plena 5ª Avenida de Nova Iorque, não se sentiria mais perdido.
Tive a sorte de ser achado por um amigo, quase da minha idade, que me salvou da completa solidão. Conforme permitia o som ambiente, até papeamos um pouco. Uma observação dele fez-me pensar. Em dado momento, olhando para baixo, opinou: “É aqui que a nossa juventude vem se perder”. Falou sem ressentimento nem inveja. Quando ele era jovem, por certo não existia balada. Ainda que houvesse, de nada lhe serviria. Teve que estudar e trabalhar duro, desde muito cedo.
Hoje, que muitos pais conquistaram bom patamar econômico para a família, os filhos têm na balada sua mais frequente (senão única) diversão. Encontramo-nos, em alguns domingos, por volta das seis da manhã. Eu, a caminho da Catedral; eles, voltando de carro para casa, onde os pais não conseguem dormir enquanto não chegam. Pela forma como alguns dirigem, não saberia dizer se estão sóbrios. Pais se angustiam com razão. Mas que outro divertimento eles têm? A propósito, outra pergunta se impõe: o que a cidade oferece para os pobres? Para aqueles jovens dos bairros, que não têm carro nem dinheiro nem mesada? De que diversão dispõem estes?
Aprendi por experiência, ao trabalhar com eles nos meus anos de padre moço, que os jovens são generosos. Isso não é poesia nem frase de efeito. A juventude é mesmo o tempo do heroísmo. Da coragem para coisas difíceis. Mas precisa que descubram valores reais, não fictícios.
É chato dizer, mas nosso tempo anda carente de quem lhes mostre tais valores. Os mais novos repetem os exemplos que conhecem. Uma sociedade constrói-se conforme modelos. Os jovens seguem aquilo que admiram nos adultos. Que modelos nossa meninada vem observando em nós, mais velhos?
Será que só o consumismo desenfreado que veem na sociedade consegue matar a sua sede de viver?

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