Anjos ou demônios?

De José Luiz Boromelo:
Copa do Mundo 2014A participação da seleção brasileira na Copa do Mundo de futebol 2014 terminou de forma melancólica. Após a derrota humilhante para a ótima equipe alemã, nossos jogadores não deram conta da eficiência de Van Persie, Roben e companhia na disputa pelo terceiro lugar da competição. O orgulho verde-amarelo foi ofuscado pela saraivada de gols (10 em dois jogos), sem direito a reclamações. O inexplicável “apagão” de seis minutos que acometeu nossos futebolistas não deixa dúvidas de que algo precisa ser feito para se mudar radicalmente a forma de gestão desse esporte que atrai, encanta e apaixona pessoas em todo o planeta. De nada adianta apontar os responsáveis pelo fracasso acachapante, mas é imprescindível identificar e corrigir os erros cometidos, uma forma de mostrar ao torcedor que os cinco títulos mundiais haverão de ser honrados nas próximas edições do evento.

A seleção brasileira não vinha apresentando um futebol consistente há um bom tempo, apesar da conquista da Copa das Confederações no ano passado. E talvez esse tenha sido o maior equívoco desse grupo, supostamente ajustado e coeso, pelo menos para sua fiel torcida. A presença constante do torcedor (inclusive nos treinos) teve efeito contrário do esperado e parece ter desencadeado uma confiança excessiva, que não se traduziu em resultados positivos. Cantar fervorosamente o Hino Nacional Brasileiro à capela emociona, mas não define o placar do jogo, que é decidido dentro das quatro linhas. Não se admite que um time formado por profissionais calejados em disputas importantes (a maioria defende clubes da Europa) não tenha competência suficiente para administrar um resultado adverso e até mesmo conduzir os rumos daquela fatídica partida.
Como do passado não se muda absolutamente nada, o jeito é assimilar o golpe. Que deverá ser uma tarefa dolorida para muita gente, diante das intermináveis demonstrações de carinho por parte do torcedor brasileiro. O mesmo torcedor que acompanha seus ídolos com os bolsos cada vez mais estufados por campanhas publicitárias das mais variadas possíveis e que não perdem tempo em capitalizar o prestígio momentâneo. De automóveis a produtos de higiene pessoal, de eletrônicos a bebidas, roupas e perfumes, vale tudo enquanto o fuleco dominar a área. Aos nossos subjugados futebolistas resta ainda um consolo: contracenar com Silvester Stalone, Jean Claude Van Damme, Arnoldo Schwarzenegger e seus amigos no filme “Mercenários 4” ou uma apresentação de gala na cinematográfica Broadway, com seus mais de 40 teatros. Badalação e encenação em demasia não combinam com a seriedade e a concentração que o momento requer. Os endeusados midiáticos foram vergonhosamente reconduzidos à terra e como qualquer mortal sentiram o peso da responsabilidade extravasado em forma de lágrimas, que nem psicólogo deu jeito.
E o nosso técnico Scolari entrou para a história, quebrando todos os recordes dos últimos 100 anos em Copas do Mundo. Conseguiu levar seus comandados a uma derrota humilhante, teoricamente inimaginável em competições de alto nível. Cercado de “aspones” inúteis viu sua tropa ser massacrada em campo sem tomar uma atitude decente. Nem teve a iniciativa de reposicionar a defesa ou o meio de campo enquanto o barco adernava com o segundo gol alemão, deixando seus homens à deriva da própria sorte. Tal qual o capitão do Titanic, foi imprudente e negligente ao extremo. Perder por sete, oito ou dez não é a questão, é uma das três alternativas de quem disputa uma partida de futebol. Mesmo ante a derrota iminente, esperava-se o mínimo de empenho e dignidade de profissionais que recebem (e muito bem!) por seu trabalho. Mudanças urgentes são necessárias. A retomada de rumo deve ser profunda, alcançando a comissão técnica e o elenco. Do alto dos cinco títulos conquistados, da tradição de nossa seleção e do inacreditável “chocolate” impingido pelo selecionado alemão, fica a pergunta: “Isso pode, Arnaldo?”
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(*) José Luiz Boromelo, escritor e cronista.

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