Quando vale a pena imitar

Do padre Orivaldo Robles:
padreorivaldoNa última edição do “Bem, amigos” perguntaram a Levir Culpi a diferença entre ser técnico de futebol no Japão, onde trabalhou muitos anos, e no Brasil. Embora atento ao horário do programa, ele disse que as três primeiras palavras japonesas que ouviu num vestiário foram: “com licença”, “desculpe” e “obrigado”. No Brasil, o que se ouve, em vestiário ou fora dele, são três palavrões cabeludos, que ele falou, mas não tenho coragem de reproduzir. É a diferença entre povo que valoriza a educação e povo para o qual educação não passa de tolice ou frescura.
No interior paulista, quando criança, vi poucos japoneses, nisseis ou sanseis. Aqui, conheci pessoas de olhos puxados, cabelo liso, voz mansa e sorriso doce. Em geral, educadas.
“Ah”, dirão alguns, “o Japão tem cultura multimilenar; o Brasil mal passou dos 500 anos. Somos muitos povos fundidos num só; não somos um povo único. O brasileiro, como tal, não existe. Daí nossa singularidade”.
Pode ser. Mas por que cargas d’água só imitamos o que não presta? Por que nos matamos atrás de dinheiro, de prazer e de poder como única forma de obter felicidade? Dentre todas as formas de viver, só é válido o jeitão capitalista e liberal? Olhar o próprio umbigo, acumular riqueza, mesmo comprometendo a paz e destruindo o planeta – isso é que torna a humanidade realizada e feliz?
Quem já não viu na TV um grupo de criancinhas japonesas, de três ou quatro anos, caminhando para a escola, sem nenhum adulto a tomar conta? Lá é possível: todos os cidadãos sentem-se responsáveis por suas crianças. Veem nelas o bem mais precioso do país. Alguém imagina cena igual no Brasil? Admitiriam isso os nossos pais e mães babões, para quem seus filhotes são os mais perfeitos do Universo? “Nós temos outra cultura”, dirão. Sei, sei. O que temos mesmo é o egoísmo elevado à categoria de norma de vida. Desde o berço, criança de classe média ou rica é adorada como um príncipe. Não se mistura aos plebeus. Muitos pais ensinam os filhos a andarem de narizinho arrebitado. E aí? É outra cultura ou falta de educação?
Com um território 80% montanhoso e impróprio à agricultura, com adversidades climáticas e históricas tragédias humanas, os japoneses entendem que o maior tesouro do país é seu povo. Por isso investem tanto em educação. Na recente Copa do Mundo, japoneses causaram surpresa ao recolher o lixo que produziram nas arquibancadas do estádio. A lição eles aprendem lá na infância. Desde o maternal são os pequeninos que limpam a sala. Não há zeladoras encarregadas disso. Praticar higiene é parte do processo educativo. Não só para a escola, mas para a vida.
Gesto como o daquele alto executivo de uma multinacional é rotineiro. No dia da limpeza do seu lado da rua, ele recolheu o lixo como qualquer morador. Boa lição para um decasségui brasileiro, que se considerava importante demais para trabalho tão “humilhante”. Se o modelo é positivo, a imitação é válida. Não é vergonhosa.
Não sei onde eu li, faz algum tempo, que importante político japonês foi processado por corrupção. Pela vergonha de haver traído a confiança dos eleitores, recorreu ao suicídio. Espero que ninguém me acuse de apontar o caso como sugestão para nossos homens públicos. Até porque nesta terra descoberta por Cabral os costumes políticos são bem diferentes.

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