Sobre homens e bodes: 7 motivos para não prorrogar os contratos de pedágio do Paraná

Pedágio

A estratégia é antiga: sua família não está contente com a situação da casa? Coloque um bode na sala. Amarre o animal no pé da mesa e o deixe lá por alguns dias. O bode vai berrar, comer o tapete, babar no sofá e, principalmente, fazer muita porcaria no chão. Quando ninguém mais aguentar a presença do mamífero, bata no peito e… tire o bode da sala. Pronto, seus problemas acabarão.
Depois é só relaxar e testemunhar a gratidão trazer de volta a harmonia que um dia reinou em sua residência.

A criação de um problema fictício para resolver outro real tem enorme aplicação na política. Em um meio marcado pela retórica, em que o objetivo é produzir justificativas simples e de fácil compreensão pela população, a tática do bode é um sucesso.
Veja o caso dos contratos de pedágio do Paraná, por exemplo. Desde que se revelou que o governo estadual negocia a prorrogação dos atuais contratos por mais 25 anos, sem licitação, o governo procura convencer a população de que a medida é indispensável para resolver o imbróglio em que se transformaram as concessões paranaenses.
De acordo com o governo, se não houver a prorrogação, o Tesouro do Estado corre o risco de desembolsar em favor das concessionárias centenas de milhões de reais (talvez bilhões) ao final dos atuais contratos, em 2021. Isso ocorreria porque as empresas teriam direito a valores assegurados contratualmente que não lhes foram repassados ao longo da concessão.
Ainda de acordo com o governo, a prorrogação também poderia pôr fim às ações judiciais envolvendo as partes, superando-se um passivo que pode ser bastante prejudicial ao Poder Público.
Como se não bastasse, o governo também alega que a prorrogação, de quebra, traria dois grandes benefícios à população: a inclusão de novas obras nas rodovias desde logo – em especial, duplicações –, e a redução das tarifas de pedágio em percentuais significativos.
A proposta de prrogação dos contratos paranaenses é atualmente encampada por dois homens fortes do governo Beto Richa: o próprio governador e o deputado federal Ricardo Barros, marido da vice-governadora e futuro secretário do Planejamento. Até recentemente, a proposta também tinha um terceiro padrinho de peso no governo, o então secretário da Casa Civil Eduardo Sciarra, que deixou o cargo no mês de março.
Como um enorme bode na sala, forte e barulhento, a divulgação da proposta de prorrogação dos contratos foi arrebatadora.
Os pedágios talvez sejam o assunto mais controverso da vida pública do Estado em mais de uma década. Embora poucos cidadãos paranaenses queiram voltar à época das estradas mantidas apenas pelo governo, é praticamente consenso no Estado que os preços praticados são escorchantes se comparados aos investimentos realizados nas rodovias. A conclusão ampara-se não apenas no senso comum, mas foi confirmada em processos de fiscalização do Tribunal de Contas do Estado (TCE) e do Tribunal de Contas da União (TCU) e em algumas ações que tramitaram no Poder Judiciário.
Depois da divulgação da proposta de prorrogação, contudo, todos os problemas envolvendo os contratos agora parecem irrelevantes. O importante é tirar o bode na sala.
Dezenas de eventos já foram organizados sobre o assunto pela sociedade civil, centenas de entrevistas e reportagens foram escritas ou levadas ao ar, uma frente parlamentar contra a prorrogação formada por deputados estaduais e federais deve ser instalada em breve, e até mesmo uma ação judicial foi movida pelo Ministério Público Federal para impedir que o Estado renove as concessões sem licitação, com resultado preliminar exitoso.
Enquanto isso, porém, diversos aspectos sensíveis dos contratos vigentes têm passado incólume à análise ou discussão, como se não existissem ou já tivessem sido superados. Ao mesmo tempo, o Estado segue celebrando diversos aditivos com as concessionárias e aumentando ainda mais os preços dos pedágios, sem que os fatos despertem a devida atenção. Leia na íntegra.

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