Como se forma o desrespeito às mulheres?

Ilustração

Por Zery Monteiro:

Se eu nascesse homem e não fosse homossexual, eu certamente iria querer me relacionar com um homem. Minha certeza disso é porque desde criança eu ouviria: “Tá chorando qui nem minininha!”, “Larga de sê fraco, parece mulherzinha!”, “Fala grosso rapá, fala qui nem home!”, “Se apanhá na escola, vai apanhá quando chegá im casa!”, “Para de rebolar desse jeito, tá dançando que nem uma vadia!”, “Olha lá aquela gostosa!”, “Mulhé é boa só pra fazê sacanagem!”.

Então quando me tornasse um adulto, cheio das incertezas próprias da humanidade, choraria escondido pela decepção de saber que eu não tinha me tornado o homem ideal que me treinaram para ser. Sendo adulto, incoerentemente seria cobrado justamente para buscar uma mulher como companheira. Como assim? Mulher que sempre me fora apresentada como um ser fisicamente mais fraco, chorão, com voz fina, que dança como uma vadia e que serviria apenas para sacanagem? Não, eu buscaria encontrar um homem ideal: um ser que nunca chora, não apanha de ninguém, sabe dançar com masculinidade, fala grosso e aprendeu, assim como eu, desde criança, que a mulher é um ser inferior.
No entanto eu nasci mulher e tive um filho. Confesso que congelei quando vi na carne que a sociedade não está preparada para receber seres humanos. Tive que tomar atitudes como deixar de dar “bitoquinha” em sua boquinha, porque ele seria condenado, mesmo sendo um bebê, se fizesse isso em um coleguinha. Por outro lado, já no Ensino Fundamental, numa reunião costumeira, um professor que havia repreendido meu filho por ter chorado, ficou incomodado e depois reflexivo, quando eu disse que meu filho não poderia levar uma arma para a escola, não poderia andar nu pelo pátio, não poderia ser desrespeitoso com o porteiro ou com qualquer pessoa daquela escola, mas que chorar ele podia sim.
Foi um processo longo até compreender que mais importante do que ter um filho bem sucedido, com esposa e filhos, é ter um filho que consiga se colocar no lugar do outro. Que se indigne com as injustiças sociais. Um filho que traga para si a responsabilidade de tentar fazer um mundo melhor, porque o desrespeito às mulheres, na verdade, é o desrespeito ao outro.
Hoje já não me preocupo como será a relação do meu filho com sua companheira, porque eu e seu pai lhe ensinamos que homens e mulheres sorriem, choram, têm cada qual seu timbre de voz, sua força física, e que na vida, ambos mais apanham que batem e que somente o respeito ao outro é que faz o ser, se tornar humano.

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