Motoristas usam linha de trem para escapar de pedágio

Arapongas

De Wilhan Santin, hoje na Folha de S. Paulo:

Um forasteiro que chega ao Patrimônio do Ceboleiro, na zona rural de Arapongas, no norte do Paraná, custa a entender algumas coisas. Por exemplo: um muro com 1.938 metros de extensão e mais de um metro de altura margeia estradas vicinais e cerca um terreno em que não há nada -apenas um extenso matagal. Já na linha férrea que passa pelo local, circulam carros, motos e até caminhões.
A explicação para esses fatos inusitados está em uma praça de pedágio instalada perto dali, na BR-369, e administrada pela Viapar.
No início de junho, a concessionária utilizou tratores e cavou valetas em um terreno municipal que se ligava à estrada rural e servia como uma rota de fuga do pedágio.
Desde então, aqueles que não querem pagar a tarifa de R$ 8,20 para automóveis, R$ 4,10 para motocicletas e R$ 14 por eixo para caminhões se arriscam andando cerca de um quilômetro pela linha férrea.
Já o muro é uma contrapartida da Viapar com a Prefeitura de Arapongas. Em acordo de outubro, a cidade se comprometia a não deixar abrir uma “rota de fuga” e a concessionária assumia a construção do muro, cercando um futuro parque industrial.
Porém, segundo o prefeito Sérgio Onofre da Silva (PSC), que assumiu em janeiro, o muro não terá serventia, já que ele não deve tocar o projeto da gestão anterior.
“Para fazer o parque industrial seria necessário investir R$ 12 milhões em infraestrutura. Não temos esse dinheiro. Além disso, teríamos que doar terrenos para as empresas, o que é vedado por lei.”
O fechamento da rota alternativa revoltou moradores de Arapongas e de Rolândia, distantes 14 km. Muitos alegam que precisam se deslocar entre as cidades para trabalhar e pagam caro para rodar pouco.
É o caso de Osmar Pedrasoli, 69, dono de um caminhão para transportar carros quebrados. Encontrado trafegando pelas margens da via férrea, justificou: “Se eu for passar pelo pedágio a cada vez que levar um carro de um município para o outro, vou pagar para trabalhar”.
Já o mestre de obras Elias Ferreira de Jesus, 43, costuma acompanhar construções nas duas cidades. Duas viagens entre elas no mesmo dia resultaria em um gasto de
R$ 32,80 só com pedágios. “Como usamos a rodovia, acho justo pagar, porém uma taxa proporcional, reduzida.”
Donos de um sítio onde plantam café, José, 67, Valdir, 70, e João Paulo Lonardoni, 36, são obrigados a pagar pedágio a cada vez que precisam ir à área urbana do mesmo município. “Até para ir ao SUS temos que pagar”, diz José.

TARIFA ZERO
Um movimento denominado Tarifa Zero foi criado por usuários da rodovia. Eles pedem a abertura de uma estrada alternativa para moradores de Arapongas (116,6 mil habitantes) e Rolândia (57,8 mil), ou descontos para os veículos das duas cidades.
“Só queremos o que é justo, pagar pelo que usamos ou ter a alternativa de não usar e não pagar. Foram feitos acordos entre a prefeitura e a Viapar que não beneficiam em nada a população. Quem se beneficia de um muro no meio do mato?”, questiona o comerciante Heleno Santos, 39, integrante do movimento.
Para fechar a passagem utilizada pelos moradores, a Viapar diz se apoiar em decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) e acordos firmados com a Prefeitura de Arapongas. A concessionária não revela quanto gastou com o muro.
O procurador jurídico do município, Rafael Cita, confirma que acordos foram feitos entre a concessionária e a prefeitura em gestões anteriores e que houve uma decisão liminar do STF em 2006 proibindo a rota de fuga, a qual, porém, não teria mais eficácia pelo fato de a ação ter sido extinta posteriormente.
“Estamos analisando tudo do ponto de vista técnico para concluirmos como proceder diante da briga entre a população e a concessionária”, declara o procurador.
De acordo com o prefeito, o imposto gerado mensalmente pela praça de pedágio instalada em Arapongas é de aproximadamente R$ 77 mil.

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