Louvação ao meu amigo padre Orivaldo Robles

Por Laércio Souto Maior:

Começo este artigo solicitando aos leitores esquecer por um momento a imagem do pacato e operoso Monsenhor Orivaldo Robles, vigário paroquial da Catedral Metropolitana de Maringá, e juntos retornarmos aos perigosos e trepidantes anos quando o povo brasileiro convivia com o regime militar implantado em nosso país a partir do dia 1º de abril de 1964, e sua juventude dourada pegava em armas para tentar, em vão, derrubar o governo usurpador.

Na época da Ditadura Militar(1964–1985), na cidade de Maringá, situada na região Norte do Estado do Paraná, o jovem padre Orivaldo Robles, ao percorrer o sendero luminoso da sua vocação sacerdotal honrou o legado de luta pela liberdade e pela democracia dos padres e frades revolucionários brasileiros. Vamos, pois, resumir suas atividades políticas no período que vai da década de 60 à década de 70, paralelamente as suas atividades religiosas no decorrer de cada ano litúrgico pregando nos retiros, celebrando missas, casamentos, batizados e enterros:

– Após o falecimento da freira francesa Jeanne Gaudin, fundadora do Coletivo Grupo Lebret que se reunia na Associação Diocesana de Assistência Rural — ADAR, na paróquia de Santo Antonio, e que atuava num trabalho de base no bairro proletário do Mandacaru, o padre Orivaldo Robles assumiu a responsabilidade de coordenar e dar assistência àquele reduto da Igreja Popular que propagava o ideário da Teologia de Libertação, na Cidade Canção;

– Na sequência, o padre Orivaldo Robles ajudou a organizar um Comitê de Apoio aos operários grevistas participantes da grande greve geral de outubro de 1968, em Maringá;

– Nos sermões proferidos pelo padre Orivaldo Robles nos púlpitos das igrejas onde atuou como pároco e nas aulas ministradas no Colégio Gastão Vidigal e no Instituto de Educação, em Maringá, e no Ginásio e Escola Normal da cidade de Paranacity, denunciava a Ditadura Militar como culpada pela perda dos ideais democráticos e humanistas do povo brasileiro;

– No dia 7 de setembro de 1968, numa solenidade pública o padre Orivaldo Robles atacou o governo militar afirmando que o Brasil dominado pelo Império Norte-Americano não era um país independente nem em termos políticos nem economicamente;

– Como consequência das suas atividades políticas, e desse pronunciamento, padre Orivaldo Robles foi fichado pela Delegacia de Ordem Política e Social — DOPS e proibido de lecionar nos estabelecimentos de ensinos oficiais.

Ao terminar este artigo, tenho certeza que o padre Orivaldo Robles, descendente do bravo povo espanhol, ficaria contente com a transcrição, que ora faço, do poema Auto-Retrato de autoria do intrépido catalão, Dom Pedro Casaldáliga, líder da Prelazia de São Felix do Araguaia, que ele tanto admirava.

AUTO-RETRATO
Com um calo por anel,
monsenhor cortava arroz.
Monsenhor “ martelo e foice “?

Chamar-me-iam subversivo.
E lhes direi: eu o sou.
Por meu povo em luta, vivo.
Com meu povo em marcha, vou.

Tenho fé de guerrilheiro
e amor de revolução.
E entre Evangelho e Canção
sofro e digo o que quero.
Se escandalizo, primeiro
queimei meu próprio coração
no fogo desta Paixão,
cruz de seu próprio madeiro.

Incito à subversão
contra o Poder e o Dinheiro.
Quero subverter a Lei
que perverte o povo em grei
e o governo carniceiro.
(Meu pastor se fez Cordeiro.
Servidor se fez meu Rei).

Creio na Internacional
das frentes levantadas,
da voz de igual para igual
e as mãos entrelaçadas…

E chamo à Ordem de mal
e ao Progresso, de mentira.
Tenho menos Paz que ira.
Tenho mais amor que paz.

…Creio na foice e no feixe
destas espigas caídas:
uma morte e muitas vidas!
Creio nesta foice que avança
– sob este sol sem disfarce
e na comum Esperança –
Tão recurvada e tenaz!

Pedro Casaldáliga

(*)Laércio Souto Maior
Escritor, historiador e jornalista pernambucano, radicado em Curitiba-PR. Publicado no Medium

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