vila marumby
Cidade dos sofás
A zona proibida de Maringá
Histórias e personagens marcaram trajetória da antiga zona de prostituição de Maringá, que funcionou na Vila Marumby entre as décadas de 50 e 70
O escritor José Hilário volta à praça da Vila Marumby: recordações da antiga zona de Maringá
Texto Donizete Oliveira
Fotos Ivana Martins e Carlos Ronchin
donijornalismo@gmail.com
Nas décadas de 50 e 60, muitos libaneses vieram para o Brasil em busca de oportunidades que não encontravam no velho mundo. Propagava-se que aqui era a terra do novo mundo. A Companhia Melhoramentos Norte do Paraná, colonizadora da região, fez propaganda em alguns países europeus sobre o eldorado que se abria no Norte e Noroeste do Paraná.
Alta, cabelos negros, lábios carnudos, charmosa e fino trato. Assim era Fátima, libanesa de Beirute. Com sua conversa atraente ganhava a simpatia de seus interlocutores. Atraída pela nova terra, embarcou num navio grego rumo ao Brasil.Continue lendo ›
Último bar resiste
O pioneiro Joaquim Caetano, cujo bar resiste ao tempo na Vila Marumby
O pioneiro Joaquim Caetano da Costa, 78, nasceu em Correntes, município de 17 mil habitantes no agreste pernambucano. Chegou a Maringá em 1953. Veio atraído pelo café, que na época tinha fama de fazer fortuna no Norte e Noroeste do Paraná. “A gente ouvia falar muitas coisas boas dessa região, então resolvi conhecer”.
Em 1969, ele se mudou para a Vila Marumby e instalou um bar que está até hoje no local, o Bar Nordestino. “Fiz minha vida aqui, na época corria muito dinheiro”, declara. Caetano vendia bebidas, salgadinhos e tinha uma percentagem no preço cobrado pelas mulheres que acertavam programas no seu bar.Continue lendo ›
Tinha até cadeia no local
Osvaldo Reis diz que até cadeia existia no local
O escritor Osvaldo Reis, 62, guarda boas recordações da zona da Vila Marumby. Aos 15 anos, começou a frequentá-la. Sem o que fazer à noite, ia à zona. Não tinha dinheiro, mas diz que era boa pinta e sempre arrumava alguém para dormir com ele. “As mulheres gostavam de mim”, declara.
Ele afirma que sua lembrança mais marcante era da cadeia que existia no local. Embora nunca tenha ficado lá, Reis diz que era uma sala improvisada para prender pessoas envolvidas em pequenas confusões. “Alguns permaneciam até o dia seguinte, outros eram soltos duas, três horas depois”, conta.Continue lendo ›
Delegado cassou alvarás
O ex-vereador João Scramim mostra jornais que retrataram a polêmica causada pelo fim da zona
O então vereador João Waldecir Scramim, hoje com 71 anos, não foi o responsável pelo fim da zona de prostituição da Vila Marumby. Natural do interior do Estado de São Paulo, ele chegou a Maringá em 1951. Entre 1973 e 1976 foi vereador pela Arena.
Ele diz que a zona de prostituição impedia o crescimento da cidade pelo lado do cemitério e Avenida Cerro Azul. Maringá só crescia em direção ao Jardim Alvorada e à Vila Morangueira. Incentivado por moradores, apresentou um projeto de lei na Câmara propondo o fim da zona de meretrício na Vila Marumby. A proposta causou polêmica. Continue lendo ›
Fatores que determinaram o fim das zonas
Psicóloga Eliane Maio aponta fatores que puseram fim às zonas de prostituição
A psicóloga Eliane Rose Maio, 51, diz que o fim das zonas de baixo meretrício, como eram conhecidas, deu-se por aumento das doenças sexualmente transmissíveis, emancipação da mulher e liberdade sexual.
Especialista em sexologia, doutora em educação e professora da UEM (Universidade Estadual de Maringá), ela afirma que o alto índice de doenças sexualmente transmissíveis começou a preocupar os homens. Diagnósticos de sífilis e gonorréia os deixavam expostos e causavam problemas na família.Continue lendo ›
Cantor começou na zona
Rebite começou cantando nas boates da zona, na Vila Marumby
O sapateiro Wanderley Guilherme da Silva, 58, o Rebite, cantou por 10 anos nas boates da Vila Marumby. Ele e o conhecido cantor maringaense Nego Rosa animavam as noites do local na época da Jovem Guarda. Rebite começou a se apresentar nos programas da Rádio Cultura. Surgiu, então, a oportunidade de ganhar algum dinheiro cantando na zona.
Ele aceitou e não parou mais. Difícil era chegar ao local. Havia apenas uma estrada cercada pelo mato e um ônibus que ia até a Vila Marumby por volta das 22 horas. Para voltar, só de carona, se tivesse sorte de conseguir uma.
Nas quintas, sextas e sábados, o movimento nas boates era intenso. Vinha gente de toda a região. De vez em quando havia batidas policiais. “Eu ficava no meu canto, como era o cantor, eles não mexiam comigo”, lembra-se.Continue lendo ›
Violência afugentou clientes
Bares da Vila Marumby, cujos alvarás foram cassados em 1976
O Diário do Norte do Paraná estampava na página dois em 16 de março de 1976: “O fim da zona do meretrício”. A matéria destacava: “O ambiente na Vila Marumby é de tristeza. Ontem terminou o prazo determinado pelo delegado de polícia para o fechamento dos bares e boates”.
A alegação do delegado para a cassação dos alvarás de boates e bares se deu porque o local passou a ser frequentado por traficantes e consumidores de maconha. Charreteiros que faziam ponto na praça central da Vila Marumby, hoje Praça vereador Eurico Vieira Guido, se diziam desanimado com a falta de movimento.
Um deles, em entrevista à Folha de Londrina, em 1975, não poupou críticas à polícia, que teria desistido de fazer plantão no local. “Só continuo trabalhando porque sou velho e não quero ficar parado em casa”, reclamou. “Antigamente, isso aqui era bom para se ganhar dinheiro”.
De acordo com a reportagem da Folha, naquele ano, apenas cinco charreteiros faziam ponto no local contra 32 em anos anteriores. “Isso se deu por falta de policiamento, são raras as noites em que não há assaltos, esfaqueamentos, tiroteios e outros delitos praticados aqui”, complementou outro charreteiro.
Da Avenida Guaíra à Vila Marumby
Do professor Reginaldo Dias:
Maringá conviveu com a chamada zona do baixo meretrício (ZBM) até meados da década de 1970, quando já contavam mais de 25 anos de fundação, e o período pioneiro convertia-se em monumento da memória. A “zona” – maneira econômica que o povo adotou para se referir ao termo – então se localizava na Vila Marumby, logo após o limite sul do desenho original do plano de urbanização de Maringá, cuja fronteira, para usar uma referência atual, era a linha que hoje constitui a Avenida JK.
As zonas de prostituição costumam fazer parte da paisagem das áreas de expansão de fronteira, convertendo-se tanto em palco dos lazeres de licitude controversa quanto dos negócios que se proliferam. Até certo momento do processo de urbanização, são vistas com um pouco de romantismo e como problema a ser oportunamente erradicado.Continue lendo ›