Temas para 21 de Abril: desigualdade, pobreza, cidade…
Da professora Ana Lúcia Rodrigues:
Em primeiro lugar gostaria de dizer que tenho muito respeito pela pluralidade de opiniões porque acredito na democracia e na garantia das liberdades individuais. O problema é que a opinião da classe dominante sobrepõe-se às demais como se fosse a expressão consensual de todas, como se representasse todos os interesses de cada cidadão. Mas, isso é falso. A opinião que alcança o conjunto da população é forjada principalmente pelos meios de comunicação, cujos donos são representantes das oligarquias econômicas que comandam esse país desde 1500. Estes segmentos produziram a tragédia social brasileira que está ancorada na concentração do poder nas mãos dos proprietários da terra, dos bancos, das grandes corporações industriais e comerciais, dos meios de comunicação, das estruturas privadas nos campos da educação e da saúde. São estas as forças econômicas que mandam no país e que são, inclusive, as únicas responsáveis por cada injustiça social e por cada gota de sangue que essa injustiça produz principalmente por meio da sua maior expressão atual, a violência.
Na sociedade democrática a ser consolidada e defendida não cabe ao cidadão dar sua fortuna ao pobre, fazer justiça com as próprias mãos, promover assistencialismos de toda ordem. Pois numa democracia sólida cabe a cada cidadão exigir do Estado o cumprimento do papel a ele outorgado, bem como ações republicanas em consonância com as diretrizes consolidadas na Constituição Federal (CF). Cabe à sociedade organizada e a cada cidadão exigir que os agentes públicos detentores de mandatos construam e implementem políticas públicas que desconcentrem a renda e a riqueza, implantem a justa distribuição da terra (rural e urbana), levem ao cumprimento da “função social da propriedade”, incrementem as bases da fiscalidade para que as grandes fortunas e os grandes empresários paguem os mesmos percentuais de impostos sobre os ganhos como pagam os trabalhadores brasileiros e que incluam os abandonados e os segregados na cidade dos “cidadãos”.
Vivemos num “Estado de Direito” que assegura a cada cidadão a moradia como um direito fundamental (a propriedade privada só será garantida se cumprir sua função social), mas contraditoriamente a maioria dos gestores públicos tem mantido a especulação imobiliária em detrimento da moradia de qualidade para todos. Assim, apenas algumas (dentre as 110 mil) famílias de Maringá são os “sujeitos de direitos” protegidos pelo poder público: as 400 associadas à Sociedade Rural de Maringá (que utiliza sozinha dez alqueires de terreno público do “Parque de Exposições”), as 30 proprietárias de grandes vazios urbanos em áreas nobres da cidade, as 03 usineiras, as 14 dirigentes da grande cooperativa, as 10 que dão nome a empresas imobiliárias – loteadoras, incorporadoras e construtoras, as 10 cartoriais (a única Instituição herdada do Brasil Império), as 50 razões sociais das empresas que se sucedem nas diretorias das associações empresariais e de classe.
A CF oferece aos gestores públicos instrumentos jurídicos e urbanísticos que garantem o abandono da especulação imobiliária aos Anais da história brasileira como exemplo a ser lembrado e jamais reproduzido. Mas, para que isso se dê, a sociedade organizada e o conjunto dos cidadãos precisam decidir coletivamente se querem continuar excluindo os moradores de baixas rendas para as franjas periféricas municipais onde há todo tipo de precariedade urbana e dificuldades cotidianas ou para os municípios vizinhos onde as dificuldades se multiplicam. Se assim for, que o pacto seja claro e explícito, a fim de que ninguém seja enganado pela eloqüência de alguma preleção ardilosa e todos saibam que, em Maringá, a igualdade e a justiça são apenas representações da realidade para compor o script dos discursos belos e vazios, componentes do mundo de fantasia chamado cidade-canção. Assim nessa cidade, os “estabelecidos” terão a garantia de continuidade da histórica (nem por isso legítima) valorização imobiliária, sem precisar dos disfarces comumente utilizados na maioria dos discursos.