Colonialismo na cultura
Por Pery de Canti:
O mercado cultural com a sua singularidade de recursos financeiros advindos de políticas públicas e privadas, acompanha no decorrer dos últimos anos, a tramitação, discussão, realinhamento, aperfeiçoamento e fundamentalmente a implementação de um novo paradigma de fazer e realizar cultura, através do Procultura, e para tanto, levando-se em conta, as especificidades geográficas, mercadológicas e históricas de colonização (que se refletem nos polos industriais e financeiros do Brasil) distribuídos pelos cinco cantos deste país continental.
Notadamente que as riquezas alocadas em pilares das regiões Sudeste e Sul, vem acompanhada de uma questão antropológica, desenvolvimentista, fruto dos desbravamentos hispânicos colonialistas (sem contar nos portugueses, holandeses, ingleses…), reforçados por domínios eurocêntricos e a seguir, pela decisiva e participativa ação de fomento industrial estadunidense.
Como lei, a Lei Rouanet, é resultado de tantos outras anteriores, que adveio pelos humores da república, império, ditadura e democracia, que espelha o contexto plural e contemporâneo da sociedade que se estabeleceu e vem se transformando, sociedade esta perpassando por plebiscitos, consultas públicas, golpes, neoliberalismo, privatizações, crises sociais, econômicas, resgate de identidade nacional, tudo na busca de seu pertencimento brasileiro, de sua nacionalidade, na construção de Estado, de Nação.
A Lei Rouanet, antes de ser um bem social, reflete – como mais um elemento refratário, as distorções históricas sociais, étnicas e econômicas deste país, resultado de um pensamento destrutivo e agressivo, notadamente optado pela violência a todo custo pela exploração e a seguir pela extinção dos povos aqui localizados a época – os índios – estes lançados a escravidão estúpida – resultado da expansão e busca pelo Novo Mundo, havendo aqui, portanto o conceito de expropriar, usurpar, solavancar espiritualmente corpos e mentes através de catequizações, e migrar as riquezas nacionais para além mar. Ou seja, a perpetuação de que as riquezas nunca chegam a todos, muito pelo contrário. Eu não digo. A história diz.
Este pensamento socioeconômico da distorção de distribuição de riquezas dentro de seu próprio território, encontra ressonância na história e em mecanismos de incentivos de distribuição de riquezas dentro do próprio país, e o mercado de cultura brasileira é mais um.
Em sua luta pela independência de colônia (Brasil), o pensamento de colonizador se estabeleceu para o seu próprio povo, num viés contraditório, porém, era esta escola, era esta a metodologia, importada, imputada, um referencial a diversas outras regiões e países que buscaram a sua independência. Tal qual se fez a nós por estrangeiros, coube a nós nacionais, a nos fazer o que se fez a nós. E se faz por cultura, por herança.
O mercado reflete a nossa história, a nossa face mais cruel importada, transfigurada na nacionalização de preceitos mercadológicos, sociais e educativas externas na nossa trajetória como atores deste modelo social que detemos e invariavelmente estimulamos a ter. E lei como lei, reflete a sociedade que se tem. Nem certa e nem errada. Apenas como ela se vê diariamente em seu lar, no seu ambiente social, de trabalho, familiar.
A Lei Rouanet, como outras, e portanto é uma conquista que se tem legítima na história. Distorções? A história narrada já em si, é uma interpretação que se tem distorcida. Agora, para
falar e compreender, temos que ter a história na mão, na cabeça – aberta, para entendermos as especificidades daquilo que falamos e compreendemos desse nosso mundo e sujeitar as mudanças que se fazem mister na construção de uma sociedade mais plena e justa – com acesso ao conhecimento para melhor contribuir na construção.
Mais um capítulo em nossa história. Que venha o Procultura – para todos.
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(*) Pery de Canti é consultor cultural, professor, gestor de cultura e cineasta
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