“Mataram a mulher?”
De André Petry, na revista Veja desta semana:
No dia em que seria espancada até a morte por uma multidão furiosa, Fabiane Maria de Jesus acordou ansiosa para estrear sua nova aparência. Cansada da longa cabeleira negra, mandara cortá-la à altura do pescoço e, na noite anterior, logo que o marido saiu para seu trabalho noturno, resolveu mudar a cor dos cabelos. Descoloriu-os com água oxigenada e pintou-os de loiro. Eles ganharam uma cor de fogo, entre o vermelho e o amarelo. Concluída a mudança visual, Fabiane tomou o remédio para dormir que lhe fora receitado havia três semanas, e adormeceu de cabelos novos na sua última noite de mulher faceira. De manhã cedo, vestiu um short jeans, uma blusa tomara que caia e uma jaqueta, também de jeans, e colocou um boné para esconder os cabelos novos. Pronta, pegou a bicicleta e saiu para passear. Sua sogra, Maria de Jesus, que mora no andar de cima da casa, percebeu no ar o movimento matinal de Fabiane:
— Eu senti o cheiro do perfume dela.
Precipitou-se até a varanda do andar de cima para lhe falar, mas Fabiane já dobrava a esquina de bicicleta.
Foi a última vez que a viu.
Era quase meio-dia, Fabiane já passara na casa de uma prima e já pedalara pela Praia das Pitangueiras quando resolveu ir até o serviço do marido, que ainda não tinha visto seus cabelos novos. Jaílson, seis anos mais velho que Fabiane, trabalhava à noite na portaria da colônia de férias do Banespa, na Praia das Astúrias. Costumava voltar para casa antes da 1 da tarde. Naquele dia, quando Fabiane chegou, ele acabara de deixar o trabalho.
— Soube depois que fazia uns dez minutinhos que eu tinha saído quando ela chegou — diz o viúvo.
Foi a última vez que se desencontraram. Leia mais.