Mês de outubro ano de 1918. Grippe espanhola

Por Jorge Villalobos:

“Não se sabe mais por onde anda a alma da cidade, desaparecida das ruas, ermas e tristes.

O que se vê é um transeunte que vae espirando seu frasquinho de sal, na ancia preventiva das vias respiratórias: alguns bonds com meia dúzia de passageiros, os galões de algum caixão de defunto que se equilibra na cabeça de um carregador, pharmacias de portas meio cerradas e com grande freguesia, uma freguesia silenciosa e que não abre a boca com receio de invasão de elementos pathogenicos da “espanhola”.

“Os quitandeiros cruzam algumas ruas, mas sem grande empenho de vender e, nas grandes artérias, é diminuto, quase nullo, o movimento de vehiculos. Um automóvel da Assistencia de quando em quando passa em vertigem, sem que ninguém tema desastres porque são poucos os transeuntes. […] E assim vae se arrastrando a cidade, com todos os seus enfermos, com todos os seus contaminados, com todos os seus cadáveres”.

Assim narrava o jornal A Noite do dia 18 de outubro de 1918 a situação que vivia Rio de Janeiro, a capital da República. Era no tempo da “gripe espanhola” e da renúncia do Diretor Geral de Saúde Pública, Dr. Carlos Seidl, que na sua carta de demissão, dirigida ao Ministro da Justiça, Carlos Maximiliano, afirmava que havia perdido o apoio do Presidente da República, Wenceslão Braz, e reconhecia que havia solicitado a este “que ordenasse à censura o impedimento do noticiario abacadabrante e sensacional referente à epidemia …”.

De fato, a crítica era contundente ao trabalho de Seidl, tanto que podia ser lido claramente na Gazeta de Noticias que “E’ preciso demittil-o. uma vez que “ O lastramento espantoso que a epidemia da gripe está tomando nesta capital foi previsto por toda gente, menos pelo Sr. Diretor geral da Saude Publica, que deu, desse feitio, a prova mais cabal da sua incompetência e da sua desídia”. Desde início do mês de outubro daquele ano, corria que o Presidente da República e o seu ministro da justiça atuavam ordenando a censura, de modo que se evitassem as notícias alarmantes, sendo que os jornais noticiavam a situação de crise e reclamavam providencias mais radicais, uma vez que sequer “nenhuma das capitães dos paizes em guerra, passou até hoje uma crise igual a esta, para se evidenciar a gravidade”.

A essa altura dos acontecimentos, o “Externato Normal, escola frequentada pelas “distintas famílias” do Rio de Janeiro e dirigido à época por Drummond Alves já havia suspendido as aulas, assim como também em Salvador (BA) por determinação da Diretoria Geral da Saúde Pública da Bahia (DGSPB) as escolas fechavam.

Porém, mesmo com as medidas de isolamento social recomendadas, ainda não haviam sido proibidos os cultos e festejos religiosos, como mostra o convite das irmandades da devoção de Santo Antônio de Lisboa e Bom Jesus do Monte, para realizarem no dia 20 de outubro uma procissão de preces a São Sebastião, para a terminação do flagelo reinante, assim também houve no dia 21 de outubro outra procissão saindo da Igreja de Santo Antônio dos Pobres, na rua dos inválidos, com o mesmo objetivo, havendo amplo convite para que “os fiéis devotos compareçam a piedosa manifestação”. Veja-se que, em Salvador a DGSPB, em finais de outubro de 1918, em razão do aumento da propagação da doença resolveu suspender as procissões e outros atos externos religiosos, uma vez que se demonstrou que muitos dos que participavam, logo após adoeciam.


(*) Professor em Maringá

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