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As carreatas da Insensatez e Lula. Até quando?

A militância do obscurantismo de direita andava um tanto adormecida. As manifestações ruidosas e as carreatas de fim-de-semana em Brasília, com a participação de Bolsonaro e ministros, em 2020, que se repetiam em todo o país, pedindo a intervenção militar, o fechamento do Congresso e do STF, tinham arrefecido, ao menos até esta semana. A causa disso parece ter sido, dentre outras, as promessas não cumpridas da edição de um novo AI -5, feitas pelo filho Zero Três, e o risco de impeachment que resultou no acerto entre o governo e o Centrão. A partir daí, Bolsonaro voltou-se para a “velha política”, à qual sempre pertenceu, ainda que em posição subalterna, calando os seus arrivistas extremados. Mas, dessa letargia (vejam só!) foram eles despertos por seu mais execrado antagonista.

A insensatez não é monopólio da extrema direita. Uma voz rouca, até há poucos anos abafada pelos panelaços ensurdecedores e inibida por processos de corrupção passiva contra o seu mensageiro, volta a agitar a cena política. Lula reaparece, dá entrevistas e faz discurso. À CNN americana, no dia 17 último, em tom messiânico, afirma: “Minha prioridade máxima agora é salvar esse país.” (sic). Antes, em um discurso inoportuno, despido de maior conteúdo, cheio de auto-glorificação, como é da natureza do autor (“Nunca antes neste país…”, ao tempo em que era presidente), já havia afirmado ter sido “vítima da maior mentira jurídica contada em 500 anos de história” (sic). Contrariando os fatos, se disse absolvido das acusações de corrupção, o que não aconteceu.

A decisão do ministro Fachin de que o juiz Sérgio Moro não era competente para julgar alguns processos em que é ele réu refere-se apenas ao aspecto formal, processual, da qual cabe, ainda, recursos. Até o momento, ele não foi inocentado de nada. Mas o pronunciamento extemporâneo e vazio do ex-presidente foi suficiente para, das cinzas, reacender as chamas dos incendiários bolsonaristas, nas redes sociais e nas ruas. Em suas carreatas do último domingo chegaram ao cúmulo de provocar buzinaços em frente a hospitais em colapso, impotentes para atender a todos àqueles infectados pela covid, internados ou não e, em grande parte, em estado grave. Sem o uso de máscaras e muita desenvoltura, provocaram aglomerações e contribuíram para disseminar ainda mais o temido e letal vírus. Era tudo o que o país não precisava, neste momento.

Governadores e prefeitos – inclusive os do PT – travam uma dura luta, na ponta, para salvar vidas, tanto daqueles nas filas para internação em frente aos hospitais, nas ambulâncias, nos corredores, quanto os já internados, em enfermarias e UTIs, necessitando oxigênio e outros remédios. E estão fazendo isso sem uma coordenação federal, com o Ministério da Saúde em mãos de dirigentes omissos e incompetentes. Esses governadores e prefeitos têm tomado duras medidas, inclusive as de lockdown, para evitar a circulação de pessoas e a disseminação do corona vírus, apesar do protesto de muitos empresários. Têm agido assim desafiando as orientações e recomendações explícitas e diárias de Bolsonaro para que as pessoas não sigam e não respeitem as medidas de isolamento social por eles recomendadas e adotadas.

Lula, ao invés de dar o exemplo do isolamento social, reapresenta-se como “salvador da pátria”, em um populismo explícito, capaz de enrubescer até os próprios petistas, e inflama a reação de opositores fanáticos, que voltam às ruas clamando contra as instituições democráticas, contra ele próprio, o petismo e o comunismo, disseminando o vírus e ampliando as internações e as mortes. O lulopetismo com a política do “nós contra eles” produziu Bolsonaro. Este, no governo, transformou-se em uma verdadeira catástrofe política, potencializando e ampliando as trágicas consequências da pandemia. Nos aproximamos dos 290 mil mortos e um quarto ministro da Saúde é nomeado. Nestes tempos sombrios, não há luz à vista no escuro túnel político e de crise sanitária em que nos encontramos. Mas, até quando? Há mais perplexidade e perguntas do que respostas.

Por isso, são demasiadamente atuais, para serem ignoradas, as questões levantadas pelo compositor e poeta norte-americano, agraciado com o Prêmio Nobel de Literatura, em 2016, que se impõe ser aqui reproduzidas, em uma tradução livre: “Quantas vezes um homem pode virar sua cabeça e fingir que simplesmente não vê? Quantas orelhas um homem precisa ter para que possa ouvir as pessoas chorar? quantas mortes serão ainda necessárias até que ele saiba que pessoas demais morreram? (Bob Dylan, em Blown’ in the Wind).

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