Bolsonaro decidiu criar uma encrenca militar

Por Elio Gaspari, hoje na Folha de S. Paulo:

Faltavam três dias para a posse de Jair Bolsonaro e o professor Delfim Netto ensinou:

“Na quarta-feira o presidente terá que abrir a quitanda às nove da manhã com berinjelas para vender a preço razoável e troco na caixa para atender a freguesia. Pelos próximos quatro anos a rotina essencial será a mesma: abrir a quitanda, com berinjelas e troco. Todos os desastres da economia brasileira deram-se quando deixou-se de prestar atenção na economia da loja”.

O capitão trocou seis ministros. Noves fora as berinjelas, tinha na quitanda 14 milhões de desempregados e uma pandemia que já matou mais de 300 mil pessoas e decidiu criar uma encrenca militar. Bolsonaro teria aumentado sua influência sobre o primeiro escalão. Falta dizer para quê.

No rastro dessa troca veio o veneno: a saída do ministro da Defesa, general Fernando Azevedo, abriria o caminho para a troca do comandante do Exército, general Edson Pujol.

Não se frita comandante do Exército. A troca mais traumática dos últimos 50 anos ocorreu em 1977, quando o presidente Ernesto Geisel demitiu o general Sylvio Frota. Os dois não se bicavam há tempo, mas fritura não houve. Tanto foi assim que Frota chegou ao Palácio do Planalto sem saber que seria demitido.

(Quando Bolsonaro era um capitão afastado do Exército abrigado na política, Geisel definiu-o com três palavras: “um mau militar”.) (…)

O marechal Castello Branco era cauteloso (até demais) e tinha as ideias no lugar. Em março de 1964 ele chefiava o Estado-Maior e distribuiu uma circular reservada em que dizia: “Não sendo milícia, as Forças Armadas não são armas para empreendimentos antidemocráticos. Destinam-se a garantir os Poderes constitucionais e a sua coexistência”.

O presidente acreditava estar amparado num poderoso dispositivo militar com seus “generais do povo”. Um mês depois, João Goulart estava no Uruguai. Deu no que deu.

As Forças Armadas não são milícia e na porta da quitanda há mais de 300 mil mortos e 14 milhões de desempregados. Em qualquer país e qualquer época quem tem problemas desse tamanho não precisa de novas encrencas.​

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