O golpe militar e os anos de chumbo

Há 57 anos, no dia 31 de março de 1964, foi deflagrado pelas Forças Armadas o Golpe de Estado que implantou a ditadura militar no Brasil. Isso é história. Ainda que os tempos e o ambiente político e econômico, interno e externo sejam outros, há os que querem negar a ditadura militar ou, até mesmo, reeditá-la. Por isso, não é demais rememorar, mesmo que superficialmente, acontecimentos e fatos que determinaram e marcaram esse tenebroso período.

O embate político, militar e ideológico que vinha sendo travado entre os Estados Unidos e a então União Soviética, desde o fim da 2ª Guerra Mundial, denominado “guerra fria”, perpassava fronteiras e envolvia a todos os países, deixando pouco ou nenhum espaço para a neutralidade. Isso aconteceu com o Brasil. Um forte sentimento anticomunista dominava, à época, as forças armadas e as classes média e alta, que propugnavam um alinhamento automático e incondicional aos Estados Unidos.

As escaramuças golpistas, de militares e civis, já haviam se iniciado um pouco antes de Getúlio Vargas suicidar-se, em agosto 1954. Aceleraram-se, porém, quando o vice presidente João Goulart, em 1961, voltando de uma visita à China, iria assumir o poder no lugar de Jânio Quadros, que renunciara sete meses após tomar posse. (Atente-se para o delírio anticomunista de hoje, de Bolsonaro e seguidores, com a rejeição inicial à vacina sino/paulista, que tem imunizado milhões de brasileiros, contra a covid-19!). Incentivados e apoiados abertamente pelo governo norte-americano, os militares depuseram Goulart.

Em 9 de abril de 1964, foi editado o Ato Institucional nº 01, cassando os direitos políticos de 102 brasileiros, entre os quais o presidente deposto. Pouco mais de um ano depois, com a edição do Ato Institucional nº 2, a Constituição Democrática de 1946 virou peça de museu, com todos os poderes concentrados em mãos dos militares. Jornais, rádios e tvs, até mesmo os que apoiaram o golpe, passaram a ser diariamente censurados. Foram coibidas e reprimidas reuniões e manifestações políticas, estudantis e sindicais, entre outras. Mas, como é sabido, a sede de poder e de vindita dos ditadores não se aplaca a não ser com o poder absoluto sobre as instituições e a vida das pessoas. Assim, no dia 13 de dezembro de 1968, foi baixado o mais draconiano dos atos institucionais da Ditadura, o Ato Institucional nº 5, para dar foros de “legalidade” a todos os abusos de direito praticados no período de sua vigência, os chamados “anos de chumbo”.

O ditador de plantão ficava autorizado a decretar, sem limitações, a intervenção em estados e municípios (art. 3º); a suspensão de direitos políticos e a cassação de mandatos eletivos federais, estaduais e municipais (art. 4º); a proibição de atividades e manifestações sobre assuntos de natureza política; a liberdade vigiada e a proibição de frequentar determinados lugares etc. (art. 5º); a implantação do estado de sítio (art. 7º); a suspensão do habeas corpus em crimes (?) políticos (art. 8º). O AI-5 também excluía de apreciação judicial todos os atos praticados, e os efeitos deles decorrentes, com base em suas disposições. A partir daí, a insegurança jurídica e também física dos brasileiros, especialmente dos opositores à ditadura, passou a ser a regra dominante no país.

Houve mortes, torturas e desaparecimentos de presos políticos e perseguições de toda natureza; houve prisões sem ordem judicial nas ruas, nos lares e nos locais de trabalho. Mas, como nada dura para sempre, depois de longos e sombrios 21 anos, a ditadura militar chegou ao fim. Com a dissolução e desintegração da União Soviética, em 26 de dezembro de 1991, a “guerra fria” passou a ser mais uma página virada na geopolítica mundial. Apesar disso, por ignorância, por vocação antidemocrática e por um forte e “inexplicável” apego à violência, a ditadura militar continua sendo o regime político dos sonhos de Bolsonaro, seus filhos e seguidores!