Mandetta e Teich foram demitidos do Ministério da Saúde por discordarem de Bolsonaro, tanto em relação a gravidade da pandemia do covid-19 quanto no tocante às medidas para combatê-la. O presidente sempre afirmou que o poder do vírus estava sendo superdimensionado (09/3/2020); que o coronavírus não era tudo o que a grande mídia propagava (10/3/2020); que outras gripes mataram mais do que o coronavírus (13/3/2020); que vírus mais graves não provocaram tanta histeria (15/3/2020), e que o coronavírus era uma realidade; que assim é a vida, pois todos vamos morrer um dia (29/3/2020).
A essa visão negacionista e anticientífica se opuseram os ministros demissionários. Assim, impunha-se ao presidente encontrar alguém que com ele se identificasse inteiramente; que lhe fosse fiel e obediente; que não contestasse nem divergisse de suas idéias acerca do coronavírus, por mais irrealísticas e absurdas que fossem. Essa não foi uma tarefa difícil.
Em 16 de maio de 2020, quando as mortes pelo covid eram 12.884, Bolsonaro nomeou para o cargo um general da ativa. Eduardo Pazuello, o novo ministro, caiu como uma luva nos planos de Bolsonaro. Disciplinado, um tanto simplório, cumpridor de ordens, de qualquer ordem, desde que vinda do chefe (“um manda; outro obedece, é simples assim!”), aceitou, prazerosamente, a missão que lhe foi atribuída por Bolsonaro para implementar no ministério sua visão negacionista e anticientífica de enfrentamento da covid-19.
Com um burocrata postado na área de saúde, Bolsonaro se sentiu livre para prosseguir ditando a “sua política” de combate à pandemia. Com isso, a doença prosseguiu sendo subestimada; o tratamento precoce, sem nenhuma eficácia, introduzido no protocolo do ministério; o uso de máscara, negligenciado; o toque de recolher e o lockdown decretados por governadores e prefeitos, boicotados; o distanciamento social, tratado com desdém; as vacinas, compradas tardiamente e em quantidades insuficientes; a coordenação entre governo federal, estadual e municipal, inexistente. Mas o relacionamento entre presidente e ministro foi o melhor possível, de convivência fraternal, de entendimento e da mais completa interação, sem percalços e sem divergências.
O vírus, que nada tinha a ver com a indiferença, a irresponsabilidade, o negacionismo e a desumanidade de Bolsonaro alastrou-se por todo o país e contaminou politicamente o ministro da Saúde. Eduardo Pazuello foi demitido, em 24 de março de 2021. Nesse dia, eram quase 300 mil os mortos pela covid. Sem uma campanha publicitária clara e didática sobre o uso de máscaras e o distanciamento social, e sem imunizantes para realizar uma vacinação em massa – o presidente e o ministro deixaram o país escancarado para que a pandemia se disseminasse provocando, até hoje, a morte de 446.527 brasileiros. Ao depor na CPI da covid, quando perguntado pelo relator a causa de ter deixado o Ministério da Saúde, Pazuello, com uma certa indiferença, respondeu: Missão Cumprida! Simples assim?]
(Arte s/ foto de Edilson Rodrigues/Agência Senado)