A nota do Ministério da Defesa e a taxa de cinismo

De Miriam Leitão: “As Forças Armadas e o ministro da Defesa reagiram de forma exagerada e fora do tom a uma declaração do presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM). E assim deram mais um passo na sua politização (…) A CPI ontem deixou claro que o Ministério da Saúde do país que já perdeu 528 mil pessoas para a Covid dedica-se à guerra interna entre esquemas de poder. Militares da ativa ou da reserva, políticos do centrão se misturam nesse cenário de horror que é o governo Jair Bolsonaro”.

De Malu Gaspar: “Na manhã de quarta-feira, o ministro Paulo Guedes esteve na Câmara dos Deputados. E não conseguiu, como nenhum auxiliar de Jair Bolsonaro consegue mais, escapar de perguntas sobre suspeitas de toma lá dá cá ou corrupção no governo. Guedes respondeu com uma de suas pérolas: ” Não estou vendo nenhuma troca de dinheiro por baixo de mesa, dinheiro de cueca”. (…) Para além da elasticidade dos conceitos do ministro da Economia, que já não surpreende, chama a atenção que ela expressa um discurso cada vez mais comum no bolsonarismo: que a corrupção no atual governo não é nada em comparação com o que se passou na era PT. É como se dissessem que “a nossa corrupção é mais limpinha”. Nas redes e nos grupos, o que mais se vê é o argumento de que, se a propina não chegou a ser paga, ou se o dinheiro de um contrato fraudulento não foi liberado, então não houve corrupção. Alguém se lembra de já ter ouvido isso antes?”.

De Merval Pereira: “A nota do Ministério da Defesa e dos comandantes das Forças Armadas criticando o presidente da CPI, senador Omar Aziz, é uma distorção de suas palavras e atinge todo o Senado. Deveriam estar indignados, sim, com os militares que se envolveram em negócios polêmicos na Saúde. Tudo leva a crer que estamos diante de uma briga de quadrilhas de atravessadores de contratos de vacinas no Ministério da Saúde. Com acesso até ao gabinete da Presidência da República, como revela uma das mensagens do celular do cabo da PM Luiz Paulo Dominguetti. A prisão do ex-servidor Roberto Dias pela CPI da Covid é apenas um percalço nessa disputa de poder”.

De Josias de Souza: “A nota da cúpula militar é presunçosa porque ameaça o Legislativo —”As Forças Armadas não aceitarão qualquer ataque leviano…”— no pressuposto de que a democracia brasileira aceitaria desaforos. O presidente da CPI foi a tréplica: “Pode fazer 50 notas contra mim, não me intimida.” O que farão agora os comandantes militares? Não podendo estacionar seus tanques na entrada do Congresso, fariam um bem a si mesmos e às corporações que representam se utilizassem sua ira para condenar quem enlameia a farda. A alternativa seria aderir à retórica do capitão, que chama os rivais da CPI de “pilantras”, “patifes”, “picaretas”… Depois, bastaria pendurar uma placa na entrada dos quarteis: “Diretório do PMB, Partido dos Militares do Bolsonaro”. Não resolveria o problema. Mas diminuiria a taxa de cinismo.”