O escândalo londrinense – parte 2
Há poucos dias, foi publicada a notícia intitulada “Escândalo londrinense” em que se apresentou um fato contrário aos mais singelos princípios e convenções sociais de nossos dias. Mesmo em “terra brasilis”, o “Escândalo londrinense” gera perplexidade e revolta em qualquer ser humano minimamente sensato.
Imagine um advogado (procurador-geral do município) ser contratado para defender o interesse do município de Londrina e, num determinado processo, esse mesmo Advogado abre mão (renuncia, desiste) de defender o município, gera prejuízo aos cofres públicos e, como consequência, oportuniza benefício pessoal e daqueles com os quais trabalha. Imaginou? Então, bem-vindo a Londrina!
Acontece que, como se diz, “o Brasil não é para amadores…”. Após o extraordinário prejuízo ao município, estimado em mais de 30 milhões de reais, o espetáculo ganhou a atuação do Ministério Público do Paraná.
Esta valorosa instituição de defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais recebeu uma denúncia do Sindicato dos Servidores do Município de Londrina (Sindserv), do que decorreu a abertura de um Procedimento Administrativo de investigação.
Mas havia uma “casca de banana” no caminho e o Ministério Público premiou o advogado (procurador-geral do município) com um acordo nos seguintes termos: (i) pagamento de multa civil de 35 mil reais a ser paga em dezoito meses; (ii) acordo que não representa confissão quanto à prática de ato de improbidade administrativa.
A “Parte 2” deste espetaculoso “Escândalo londrinense” é que, em artigo publicado no livro Pacote anticrime: volume I, organizado pela Escola Superior do Ministério Público do Paraná, o promotor de Justiça que propôs o referido acordo defendeu exatamente o contrário do que assinou com o procurador-geral do município.
Como revelado acima, o acordo não é uma confissão da prática de ato de improbidade administrativa. No entanto, no citado livro, o Promotor de Justiça defende que o autor de fato ímprobo está alicerçado e fundamentado a confessar a prática do ato de improbidade administrativa e de aceitar as sanções propostas.
A base do argumento é a dignidade da pessoa humana, que confere ao homem a plena capacidade de se autodeterminar, de exercer sua capacidade e liberdade como melhor lhe aprouver; de avaliar concretamente se quer ou não aceitar a sanção que decorreu da prática de um ato ilícito (ato de improbidade administrativa).
Na argumentação do promotor de Justiça, conforme artigo publicado, é contraditório, de um lado, o Estado tutelar constitucionalmente os direitos fundamentais do homem e, de outro, proibir que este mesmo homem, dotado de capacidade e liberdade, não possa decidir como melhor lhe aprouver.
O “Escândalo londrinense” já está na história do Paraná buscando algum herói que decifre o Frankenstein de um ato sancionado segundo a Lei Improbidade Administrativa e que (supostamente) não é um ato de improbidade administrativa. Nessa história escandalosa:
- procura-se alguém que diga qual a vantagem desse acordo para que o Ministério Público não entre com ação judicial para punir correta e adequadamente o servidor público que fez o que fez;
- procura-se um Prefeito em Londrina (sem amarras políticas) que exonere o servidor público do cargo de Procurador-Geral do Município, para que deixe de comandar os demais Procuradores e todos os processos judiciais e extrajudiciais, e os processos disciplinares, entre outros;
- procura-se alguém que indique quais os parâmetros que indicaram como razoável um acordo em que o Procurador-Geral do município pagará multa 833 vezes menor do que o valor gerado de prejuízo ao município de Londrina;
- procura-se um (unzinho) promotor de Justiça que confie ao procurador uma ação judicial pessoal, já sabendo antecipadamente que ele (o advogado) não fará a defesa processual como deveria e irá prejudicar o patrimônio pessoal do promotor em milhões de reais, que beneficiará a ele próprio (o advogado), e que mesmo assim o promotor o mantenha no cargo em sua defesa.
São essas, entre outras, as questões que merecem neste momento voltar à baila. Pede-se perdão pelo certo grau de humor (para controlar a ansiedade) e de ironia (para não dizer exatamente o que se deseja). Apesar do humor e da ironia, trago verdades (porque é a única que liberta, e precisamos dela!).
(*) Gabriel Antunes, advogado em Londrina
(Foto: Divulgação?PML)