O cavaleiro andante de Maringá

O mais famoso de todos os cavaleiros andantes, sem dúvida alguma, foi o personagem de Cervantes, o Dom Quixote. Lutava contra moinhos de vento e exércitos de ovelhas, tidos pelo herói como grandes gigantes e exércitos de guerreiros malfeitores. Nas suas andanças, à moda medieval, equipado de elmo e armadura, com seu braço forte empunhando uma lança em riste e junto ao seu corcel Rocinante e de seu fiel escudeiro Sancho Pança, procurava desagravar e fazer justiça aos oprimidos e humilhados. Seus conterrâneos imediatamente o tomaram jocosamente por louco desvairado, se aproveitando de sua sincera boa-fé.

Assim, com esse preâmbulo quixotesco, faço alusão, porque me faz lembrar de certa forma um pouco, ao prefeito Ulisses e suas andanças pela cidade. Não que o prefeito tenha chegado ao ponto de se arremeter contra a Catedral por enxergar nesse nosso monumento religioso e turístico um grande gigante inimigo (aliás, carinhosamente vem reinstalando os seus belos chafarizes), e muito menos esteja atacando nossas infinitas árvores como se fossem exércitos rebeldes (pelo contrário, vem cuidando de nossas queridas e simbólicas árvores com podas, tratamentos, retiradas e replantações, arborizando e rearborizando praças, parques, canteiros, avenidas e bairros).

No entanto, suas andanças pra lá e pra cá, aqui, cá e acolá, pra cima e pra baixo, por todos os cantos e lados da cidade não passam despercebidas. Ora visita uma padaria, ora uma bicicletaria ou uma ong, come um pastel na feira, bate-papo na praça, toma um café no comércio, brinca no parque canino (Parcão) com os pets, visita asilos e escolas, vai a uma festa popular, inaugura alguma obra pública e está lá na torcida pelo Maringá no Willie Davis, dá uma esticada de perna no Velódromo e prestigia uma corrida rústica de nosso calendário esportivo, e sobrando um tempinho, devora um delicioso “dogão”. Contudo, alguns insidiosos vão dizer que o prefeito simplesmente bate-pernas e descuida do seu ofício, quando o enigma de toda essa andança se revela como um ato político louvável: o gesto do prefeito é um convite singelo, mas assaz expressivo, a todos maringaenses para que caminhem juntos com ele.

E aqui não posso me furtar a citar um provérbio africano: “Se quer ir rápido, vá sozinho. Se quer ir longe, vá acompanhado.” Essa sabedoria africana inspirada na revoada dos gansos nas suas migrações, onde em grupo e em forma de “V” em cunha quebram a resistência do ar e revezam a dianteira de tempos em tempos, chegando com isso a um destino tão longínquo, também pode ser aplicada na vida coletiva de uma Cidade. Desse modo, quando o prefeito Ulisses faz sua caminhada esquadrinhando nossa urbe maringaense, ele quer com isso sentir e captar os humores de nosso povo, dialogando com uns, trocando palavras com outros, sendo todo ouvidos às reclamações, às sugestões, às solicitações e aos elogios. Até mesmo pelas redes sociais procura dar acolhida ao clamor popular! Portanto, “é andando que se faz o caminho”, como diz o velho ditado. E com essa fraternidade, empatia e solidariedade para com e pelo povo, engendra-se o espírito e a coesão social necessários, atendendo o Bem Comum.

Dessa forma, quando se come um lanche, um pastel ou se toma um cafezinho, frequenta uma de nossas várias lojas, não se trata de uma gula ou apetite voraz “ulissiano” e nem de passeios displicentes, blasé, isso seria ingenuidade de quem julga assim, pois o que está implícito, tácito nessas ações é o estreitamento dos laços sociais, é o reconhecimento do trabalho de nossa gente, é a promoção daquele feirante, produtor, comerciante. A figura do prefeito na rua, arregimenta, estimula e reaviva nosso sentimento de pertencimento da pólis, nosso espírito gregário. Catalisa e move moinhos, frui, potencializa e canaliza sinérgica e convergente as forças, anseios e vontades progressistas na conformação do Bem Comum.

Aliás, consoante a esse último, as andanças de Ulisses fez com que alcançasse plagas distantes, tal como um Emirados Árabes, levando nossa bandeira e brasão em destaque, almejando investimentos financeiros e negócios promissores para a nossa terra. Para nossa sorte, à revelia dos adversários políticos, o industrioso Ulisses conseguiu regressar são e salvo à Ítaca, melhor dizendo, Maringá (perdão, não pude evitar o trocadilho). E esse exercício de comunhão precisa ser constante e abnegado, porque sua persona pública encarna as aspirações da vontade geral, tendo em vista que os cidadãos o elegeu depositando toda sua fé, esperança e confiança.

O prefeito, como depositário principal dessa vontade coletiva, ao fim e ao cabo, em síntese, é o espelho da moral e do moral de seu povo. Na figura dele está patente ou não a fibra, a fé, o temperamento, a sobriedade, a integridade, a perseverança e a coragem, o altruísmo de toda uma gente! Na pandemia, por exemplo, nosso povo deu mostras de sua resiliência e generosidade, encontrando respaldo e liderança naquele que foi eleito como nosso mandatário para tal missão. Por isso das andanças se fazerem imprescindíveis, porque aqueles prefeitos de gabinetes encastelados sedentariamente nos paços municipais acabam por alienar e mortificar o coração de seus concidadãos. E de nada adianta saírem das suas hibernações de 4 em 4 anos nos certames eleitorais, dando tapinhas cordiais nas costas dos virtuais eleitores e vendendo felicidades politiqueiras a 3 por 2. Esse caminho da velha política populista e demagógica está por demais esbatido e sinuoso.

O povo exige o caminho da reta retidão, cujos horizontes podem ser vislumbrados e contemplados. E nesse sentido vem caminhando nosso prefeito, porque seu andar felizmente não marca passo no terreno pantanoso dos vícios da política e seu transitar não ocorre apenas oportuna e estritamente na época das eleições. Que continue, oxalá, sendo cavaleiro andante, inspirado pelo nobre Dom Quixote, cujo gênio restituía antigos valores, tal como a honra, e virtudes outras já esquecidas no seu tempo, assim como sua entrega utopista de um mundo justo e mais humano. E quem são os verdadeiros loucos do nosso tempo? São aqueles que fatalisticamente se acomodaram e se acovardaram perante o mundo, incapacitados de sonhar e andar!!!


(*) Dancler da Silva Freitas é professor de Sociologia em Maringá

(Foto: Nicolas Postiglioni)