O curitibano Luís Henrique Pellanda é reconhecido pelo seu humor sutil e perspicácia jornalística.Com mais de dez obras lançadas e passagens como cronista por importantes veículos de comunicação, ele combina habilidades literárias e experiências como observador atento da realidade para capturar a essência das coisas em suas mais diversas possibilidades e formas. Em meio a umcenário contemporâneo, em que os avanços tecnológicos nos conectam instantaneamente, Pellanda conduz o leitor por caminhos introspectivos, repletos de reflexões sobre o tempo, a memória e as mudanças sociais.
Em ‘O caçador chegou tarde’, lançamento da Maralto Edições, Luís Henrique Pellanda entrega 62 contos inéditos que mergulham o leitor na subjetividade de seus personagens, causando sensaçõesmuitas vezes simultâneas de familiaridade e desconforto. O lançamento do livro aconteceu sábado, em Curitiba.
“Nesse trabalho, em particular, optei por contos bastante abertos, com entrelinhas largas, que convidam os leitores a percorrê-los como bem entenderem”, explica o autor. “Espero mesmo queleiam o livro como se folheassem uma espécie de sonhário coletivo, a um só tempo familiar e incômodo, mas disponível à livre interpretação de cada um, a partir de suas próprias referências.”
Escrito durante a pandemia de covid-19, e em meio às incertezas políticas que cercavam o país, O caçador chegou tarde aposta na relação simbiótica entre o homem e as criaturas da natureza, um tema recorrente na escrita de Pellanda. Para o autor, a humanidade faz parte da natureza, ainda quetenha desenvolvido um desejo mórbido de negá-la. “Meu livro anterior, finalista do Jabuti do ano passado, se chama Na barriga do lobo, uma referência ao conto da Chapeuzinho Vermelho na versãodos irmãos Grimm, e também à escuridão que cercava a personagem enquanto era digerida pelo monstro”, explica Pellanda. “O caçador chegou tarde dá continuidade a essa mesma metáfora. Não sei dizer se já fomos ou se um dia seremos ‘salvos’ do lobo que ultimamente nos vem digerindo enquanto sociedade ou civilização, mas entendo que a escuridão a que Chapeuzinho um dia se referiu acabou por nos afetar a todos.”
O caçador chegou tarde abre com o conto “A aposta”, em que dois meninos desaparecem após apostar quem ficaria em cima de uma árvore por mais tempo. Eles crescem, se casam e têm filhos, mas permanecem na árvore. Com o tempo, diminuem de tamanho e desaparecem, misturando-se à natureza como se nunca tivessem existido. Em “A prata e os peixes”, um avô reflete sobre a felicidade com seu neto durante uma pescaria. Ele fisga um lambari e encanta-se com sua beleza; o peixe morre, e à noite eles o comem. A passagem leva o menino a refletir sobre a felicidade: paraele, se o avô falasse menos, eles teriam pescado mais e seriam mais felizes. Em um dos menores contos do livro, “O patriota na floresta”, lemos: “O patriota entra na floresta e faz uma descoberta. Dentro da mata, seu país não existe.”
O caçador chegou tarde apresenta elementos temáticos e estéticos que se repetem do início ao fim, com o objetivo de criar nos leitores uma impressão de unidade e estranheza. “Quando escrevi esses contos busquei misturar, em cada um deles, características roubadas dos relatos de sonho, das fábulas, das parábolas, dos mitos de criação e dos contos de fadas ao nonsense, ao humor e à falsa simplicidade formal de autores tão diversos quanto Kafka, Kawabata, Karel Capek ou, mais recentemente, Liudmila Petruchévskaia, entre tantos outros. Mas é claro que essa era apenas minha ideia inicial, e a literatura é também a arte de fracassar. Durante o processo de escrita, somos sempre forçados a mudar de rumo, o que nos leva a lugares novos e inesperados. Espero ter chegado a um deles”, finaliza Luís Henrique Pellanda.
O livro chegou às livrarias no sábado, 3, e poderá ser adquirido nos principais canais digitais de vendas.