Reflexões atuais sobre o meio acadêmico-científico
Da mesma forma como inúmeros setores de atuações profissionais possuem suas especificidades, também o meio acadêmico científico apresentam suas singularidades, que muitos de seus conviventes desconhecem, especialmente os neófitos, principalmente em consequência da visível queda nos níveis formativos, que abrangem desde os anos de estudos iniciais até os níveis de formação stricto sensu (mestrados e doutorados), aí inclusos os pós-doutorados, sobre os quais, conceitualmente até vários doutores são inábeis em seus objetivos e aplicações.
Primeiramente, esclareça-se que tendo a graduação como o primeiro nível (após o Ensino Fundamental e Médio), na sequência teremos as formações em níveis de pós-graduações que são denominados de lato sensu e stricto sensu, sendo que na primeira encontraremos aqueles cursos que denominamos de curso de especializações (alguns MBA e suas derivações, mais por interesses de marketing) e na segunda aqueles cursos que correspondem às formações de mestrados e doutorados – únicos que conferem o título de Doutor à quem quer que seja, ambas regulamentadas pela Capes/MEC (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior / Ministério da Educação).
Polêmicas à parte, teoricamente os cursos de pós-graduações lato sensu (especializações) deveriam ser mais direcionados para os interessados em especializar-se numa determinada área do conhecimento, independentemente de sua graduação, com uma perspectiva de aprendizado mais voltada par o mercado de trabalho, enquanto que a formação stricto sensu, teria um viés mais atrelado para as pesquisas e à docência no ensino superior em todos os níveis.
Recentemente, a Capes aprovou (dezembro/2018) e regulamentou (abril/2019) os cursos stricto sensu (mestrado e doutorado) à distância, assim como já existia as especializações, porém com algumas peculiaridades necessárias, atendendo às novas demandas, e em função principalmente da utilização de novas tecnologias digitais, especialmente por parte do setor privado. Interessante observar que, da mesma forma com que a pandemia desmobilizou alguns encaminhamentos programáticos no setor, ela aparentemente alavancou os processos de ensino à distância, cujos passos estão sendo retomados, embasados inclusive pela expertise derivadas do ensino remoto (online) por ocasião do isolamento imposto pela pandemia da covid-19.
Em alguns cursos e em alguns programas de pós-graduações stricto sensu, dependendo da experiência acadêmica pregressa e da capacidade do discente, pode-se ingressar diretamente no doutorado, o que ocorre comumente em países mais desenvolvidos, inclusive com a extinção do mestrado. No Brasil, embora haja exceções, tais eventos são bastante temerários, uma vez que a iniciação científica na graduação é extremamente ineficaz e ineficiente, destacando-se que a mera distribuição de bolsas de iniciação científica com seus valores irrisórios, não significa competência e formação acadêmica para formação de futuros cientistas.
Continuamos enfrentando uma severa crise na formação e manutenção acadêmica-científica do Brasil em todos os níveis, pois além da fuga de cérebros já discutida inúmeras vezes, existe uma grande lacuna em aberto, com tendência de forte agravamento, pelo perfil dos pós-graduandos ingressantes e egressos, assim como pelo perfil insuficiente de grande parte dos docentes atuantes, e que também já são frutos desta era de inúmeras dificuldades formativas no setor acadêmico-científico. Basta analisar comparativamente as qualificações curriculares (produção qualitativa) de ambos para tal confirmação, embora tais parâmetros não sejam únicas neste processo de dimensionamento, para verificarmos que temos grandes deficiências (e grandes problemas) juntos aos pós-graduandos e nosso futuro acadêmico.
Certamente, como sempre nestas paragens acadêmicas, felizmente existem apontamentos de alguns oásis, e que são responsáveis pelos destaques em nosso meio acadêmico científico, tanto quanto pelo desenvolvimento e implementação de conhecimentos e tecnologias aplicadas que resultam em grandes benefícios socioeconômicos e de bem-estar nos mais diversos segmentos do nosso cotidiano.
Entretanto, num contexto esperançoso, entre idas e vindas, entre várias polêmicas e discussões, ainda devemos considerar que existem bons programas de pós-graduações (assim como bons e abnegados cientistas) em nosso país, independentemente da falta de uma política pública mais assertiva para o setor, da carência de uma gestão mais capacitada (eficiente/eficaz) em cargos técnicos de gestão, de investimentos estruturais e financeiros e, sobretudo uma visão mais moderna de ciência, tecnologia e inovação, uma vez que ainda privilegiamos excessivamente as atividades meio em detrimento das atividades fins no âmbito da academia.
(*) Carmino Hayashi– Biólogo, doutor em Ciências, professor universitário e pesquisador científico na área de Ciências Ambientais e Sustentabilidade. E-mail: hayashi@terra.com.br
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