Um relógio não vale um litígio

Relógio Cartier Santos Dumont, usado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), é avaliado em R$ 60 mil

De Elio Gaspari, em O Globo:

O Tribunal de Contas da União decide hoje se Lula deve devolver o relógio Cartier avaliado em R$ 60 mil que ganhou em 2005 durante uma visita à França. Desde que estourou o caso das joias sauditas recebidas por Jair Bolsonaro, relógios alimentam controvérsias políticas. Bendito José Sarney, que atravessou cinco anos de governo com o mesmo relógio. (Barack Obama atravessou oito anos com um modelo barato.) Em 2009, o repórter Orlando Brito fotografou oito modelos diferentes no pulso de Lula. (…)

Jair Bolsonaro deu uma dimensão policial à relojoaria dos hierarcas nacionais. Foi para o governo com um digital comum. No poder, ganhou um Rolex de ouro, cravejado de 184 pequenos diamantes. No escurinho de Brasília, armou sua venda para uma joalheria dos Estados Unidos. Quando se começou a falar dos presentes que havia recebido, usou um advogado amigo para recomprá-lo, por US$ 49 mil. (Os mimos dados a Bolsonaro incluíam outras joias, bem mais valiosas.)(…)

Presentinho é uma coisa, joia é outra. O Cartier de Lula é um modelo de ouro, chique, porém simples. A casa francesa criou-o inspirada em croquis do Pai da Aviação, que vivia em Paris e era seu cliente. Foi ela quem o mandou a Lula. Aplica-se, no caso, o comentário do juiz americano ao tratar da pornografia:

— Não sei defini-la, mas, quando a vejo, reconheço-a.

Basta olhar para o presente e para a biografia de quem o dá. O Cartier de Lula difere do Rolex de Bolsonaro no valor e na origem.

Foto: Divulgação