O assédio eleitoral nas relações de trabalho
O assédio eleitoral não é uma prática exclusiva do ambiente profissional, podendo se manifestar em diversos contextos, como em casa, nas escolas, nas universidades, em igrejas, entre outros lugares
Com as eleições municipais se aproximando, um tema que volta aos holofotes é o assédio eleitoral, especialmente no âmbito empresarial. No ano de 2022, segundo dados do Ministério Público do Trabalho, o número de denúncias de assédio eleitoral cresceu para 2.556, sendo 12 vezes superior ao registrado nas eleições de 2018, quando foram contabilizadas 212 notificações.
Mas afinal, o que pode ser configurado assédio eleitoral?
A Constituição Federal estabelece que “a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei”. O voto, portanto, é um direito fundamental, que deve ser exercido por cada cidadão de acordo com sua consciência política.
Nesse sentido, o assédio eleitoral pode ser caracterizado, segundo Ricardo Calcini, como “a prática de atos de pressão e/ou condutas coercitivas, coativas ou discriminatórias exercidas pelo empregador ou outros, no local do trabalho ou não, sobre os trabalhadores para com vistas a influenciar ou obstar o livre exercício do direito de voto, como objetivo de direcionar o voto dos trabalhadores para um candidato de preferência do empregador, inibir a liberdade de expressão política dos trabalhadores, impor a abstenção do trabalhador na votação ou instituir o psicoterror eleitoral na relação de trabalho, com a propagação de mensagens diretas ou indiretas para a coletividade dos trabalhadores, com o intuito de induzir o trabalhador em determinada conduta eleitoral desejada pelo empregador.”
O assédio eleitoral não é uma prática exclusiva do ambiente profissional, podendo se manifestar em diversos contextos, como em casa, nas escolas, nas universidades, em igrejas, entre outros lugares. Contudo, é dentro das relações de trabalho que essa conduta assume dimensões mais graves. Isso ocorre porque, nas relações trabalhistas, o trabalhador é a parte hipossuficiente da relação e depende economicamente do empregador para o seu sustento e de sua família.
Assim, ao coagir alguém a votar ou não votar em determinado candidato ou partido, o empregador explora essa vulnerabilidade econômica e hierárquica para comprometer a liberdade de autodeterminação política do trabalhador.
Trata-se de uma conduta que não só é reprovável moralmente, como também tipificada como crime segundo os artigos 299 a 301 do Código Eleitoral.
Na esfera do trabalho, a conduta ilícita pode ainda sujeitar o empregador ao pagamento de multas, indenização por danos de natureza moral, assim como autorizar a rescisão indireta do contrato de trabalho pelo empregado, se comprovado o assédio.
A conscientização sobre o assédio eleitoral, tanto por parte de empresários quanto de trabalhadores, é importantíssima para prevenir tais práticas ilegais. O esforço no combate ao assédio eleitoral não se trata apenas de proteger um direito fundamental, muito mais que isso, é um ato de fortalecimento da própria democracia.
A promoção de um ambiente de trabalho livre de coação e influência indevida na escolha eleitoral não apenas assegura a liberdade de voto, mas também consolida a fundação sobre a qual se constrói uma sociedade democrática saudável e participativa.
(*) Renan Hurmann Salvioni, advogado do escritório De Paula Machado
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