Os agressores contumazes parecem não se intimidar suficientemente com os rigores da legislação penal, uma vez que os casos de violência contra mulheres se multiplicam assustadoramente
Conforme o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2024 o número de feminicídios aumentou significativamente, não obstante a plena vigência da lei nº 11.340/2006, mais conhecida como “Lei Maria da Penha”, que visa criminalizar esse tipo de violência no País. A violência contra mulheres representa uma das principais formas de violação de seus direitos humanos e um dado particularmente alarmante retrata a dura realidade das estatísticas: as mulheres negras são as principais vítimas da violência, somando 66,9% dos casos registrados. Grande parte das violências cometidas contra mulheres ocorre dentro do lar, perpetrada por pessoas próximas à sua convivência. E em mais de 90% dos casos, o homicídio contra as mulheres é praticado por homens com quem as vítimas possuíam uma relação afetiva.
A lei que define e tipifica as diferentes formas de violência contra as mulheres (física, psicológica, moral, sexual e patrimonial) ainda prevê a criação de serviços especializados compostos por instituições de segurança pública, justiça, saúde e assistência social. Apesar da existência desse importante dispositivo constitucional específico, que a princípio haveria de proteger efetivamente pessoas contempladas com medidas protetivas, nota-se que ainda há muito a se fazer para que as coisas funcionem como deveriam.
Os agressores contumazes parecem não se intimidar suficientemente com os rigores da legislação penal, uma vez que os casos de violência contra mulheres se multiplicam assustadoramente. A conclusão, portanto, é a de que o Estado falha ao não oferecer a segurança necessária e imediata às vítimas, ou as medidas coercitivas previstas nos dispositivos legais estão obsoletas. Ao se constatar o risco iminente à integridade física das requerentes, não se admite postergação de medidas, muito menos omissão dos agentes públicos no sentido de promover a proteção devida, com a máxima celeridade.
Nota-se que o cerne da questão se resume na educação recebida no seio familiar. A sociedade tradicionalmente patriarcal instituiu o homem como provedor do lar. Esse encargo conferiu ao chefe da família um nível supostamente elevado de poder e status sobre os demais integrantes. Inconscientemente, o mantenedor carrega consigo a percepção tosca de que a mulher é sua propriedade e a ele deve submissão. Evidentemente, essa visão equivocada da realidade decorre da desestruturação familiar, em que os valores morais e éticos são ignorados, distorcidos ou inexistentes. Esse tipo de comportamento não está diretamente relacionado às condições socioeconômicas ou formação intelectual do agressor, uma vez que fatos dessa natureza ocorrem em absolutamente todos os estratos sociais.
Finalmente, é obrigação precípua do Estado e uma demanda legítima da sociedade, enfrentar e combater diuturnamente todas as formas de violência contra as mulheres. Coibir, punir e erradicar essa cultura perniciosa e retrógrada de violência deve ser considerado como preceitos fundamentais, iniciativas imprescindíveis que alicerçam o futuro de uma nação mais justa e igualitária. A página da história precisa ser virada, definitivamente.
(*) José Luiz Boromelo, escritor e cronista em Marialva/PR
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