Presidencialismo com duas cabeças

Emendas anônimas sem prioridade, critérios, projetos e, portanto, distantes dos suportes de transparência das verbas oficiais, ensejaram a oportuna fiscalização da Polícia Federal

Somados, os valores orçamentários 2019/2025, sob a denominação de emendas parlamentares somam R$ 233 bilhões de impostos pagos pelo povo brasileiro a serviço da irrigação de bases eleitorais de um seleto grupo do parlamento brasileiro, o mais caro do planeta.

Seria por acaso que grandes países do Brics, a exemplo da China e da Índia, outrora pobres, vêm obtendo níveis significativos de crescimento, enquanto prosseguimos curvados à perene condição de país em fase de desenvolvimento? Não. A verdade é que o atoleiro da corrupção nos paralisa. Orçamento secreto é invenção genuinamente brasileira. Emendas anônimas sem prioridade, critérios, projetos e, portanto, distantes dos suportes de transparência das verbas oficiais, ensejaram a oportuna fiscalização da Polícia Federal.

Enquanto isso, seguimos com o Presidencialismo de duas cabeças: a da Presidência da República e a do esperto agrupamento liderado pelo Centrão que conseguiu alijar da própria Mesa do Senado as representações do sul, sudeste e centro-oeste; bloco de comando passou a ser exclusividade das regiões norte e nordeste.

No passado, a região centro-oeste não era “esquecida”. O rolo compressor anunciava-se em alto e bom tom. Ao chegar a Brasília para se redigir até mesmo a Constituição da República Federativa do Brasil, as boas vindas eram resumidas em cartazes afixados nas paredes do Congresso Nacional: “Norte, Nordeste e Centro-Oeste: 293 parlamentares. Somos a maioria da Assembleia Nacional Constituinte”.

Não é estranha a matemática desta maioria? Ora, ainda hoje, a maioria do povo brasileiro vive nas regiões sul, sudeste e centro-oeste, mas não está conseguindo
eleger a não ser a minoria dos congressistas. Quem manda de fato no Congresso Nacional é a eleita pela minoria dos eleitores brasileiros, historicamente concentrada nas regiões norte e nordeste. É verdade que a maioria deles continua pobre, mas é representada por abastadas “autoridades”.

Esse modelo é antigo. A invenção originou-se na ditadura militar, objetivando perpetuar as eleições dos generais-presidentes. Atualmente, sem a oportuna investigação da Polícia Federal e a ação enérgica do Supremo Tribunal Federal, o presidente da República prosseguirá cada vez mais investido na condição sui generis de representante do Brasil, enquanto a cada vez mais robusta haverá de ser a ditadura da minoria instalada no Congresso Nacional, que, orçamento secreto nas mãos, assumirá de fato o absoluto (des)governo do país.


(*) Tadeu França
ex- deputado federal constituinte.

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