Absurdo com dinheiro público

O abuso da fé e da ideologia na política: quando vereadores ignoram o estado laico e o interesse público

Por Eliana Moura Peixoto:

É com indignação e profundo senso de responsabilidade cidadã que venho me manifestar contra os dois projetos propostos por uma vereadora da nossa cidade que, claramente, desconsidera os princípios fundamentais da nossa Constituição e o dever ético de administrar com foco no interesse coletivo.

O primeiro projeto trata da criação do chamado “Dia do Patriota Conservador”, uma iniciativa que, além de não trazer nenhum benefício concreto à população, promove o uso ideológico da máquina pública para fins políticos e eleitoreiros. Num momento em que nossa cidade enfrenta carências urgentes em áreas como saúde, educação, habitação e assistência social, destinar recursos e tempo legislativo para celebrar uma corrente ideológica é um desrespeito com o erário e com a pluralidade democrática que deve ser garantida em qualquer Estado de Direito.

O segundo projeto, ainda mais grave, prevê a instalação dos “Dez Mandamentos” em vias públicas, utilizando dinheiro público para promover símbolos religiosos em espaços que pertencem a toda a coletividade. Tal medida desrespeita abertamente o princípio constitucional da laicidade do Estado, ferindo o artigo 19, inciso I da Constituição Federal, que proíbe a União, os Estados e os Municípios de estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança.

Ambos os projetos revelam uma profunda incompreensão do papel do poder legislativo municipal, que deveria estar comprometido com políticas públicas inclusivas, voltadas para a melhoria real da qualidade de vida da população – e não com pautas ideológicas ou religiosas que dividem a sociedade e colocam o poder público a serviço de convicções pessoais.

É inadmissível que se use a fé ou a ideologia para mascarar a omissão diante das reais necessidades da população. Projetos como esses desviam o foco das verdadeiras demandas do município e banalizam a responsabilidade que o cargo de vereança exige.

O povo merece políticas públicas sérias, comprometidas com os direitos humanos, a justiça social e o bem-estar coletivo – e não cortinas de fumaça criadas por uma visão estreita e excludente de mundo.

A cidade é de todos. O dinheiro público é de todos. E a política deve servir a todos – sem distinção de crença, ideologia ou classe social.