Saeb para quem?

Temos visto, principalmente nas escolas públicas estaduais do Paraná, uma insaciável busca por aprovação massiva na prova Saeb, que impactam diretamente no Ideb
Por LUIZ FERNANDO RODRIGUES
A escola precisa ser o lugar de felicidade dos nossos alunos, um lugar onde as siglas, os termos empresariais, as frases de efeito e motivacionais não tenham mais peso que o conhecimento.
O Saeb é o Sistema de Avaliação da Educação Básica e representa o principal instrumento do Brasil para medir a qualidade da educação em larga escala. Apesar disso, os principais aspectos negativos do Saeb e das avaliações de larga escala, em geral, estão relacionados à sua utilidade pedagógica e à sua capacidade de refletir a complexidade do ambiente escolar. Gerenciado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), o Saeb funciona como um grande check-up da educação básica (da educação infantil ao ensino médio) e é aplicado a cada dois anos.
Segundo a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), o Ideb sempre apresentou limitações por não considerar fatores como o núcleo socioeconômico dos alunos, a estrutura das escolas, a forma de gestão dos estabelecimentos, a forma de contratação dos trabalhadores, e como e se ocorre processo de valorização dos profissionais. É uma métrica considerada incompleta pela entidade e por diversos especialistas na área.
O que temos visto, principalmente nas escolas públicas estaduais do Paraná, é uma insaciável busca por aprovação massiva na prova Saeb, que impactam diretamente no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). Já outra estratégia desastrosa foi fechar escolas noturnas regulares e de EJA, pois os estudantes trabalhadores têm menos tempo para estudar e costumam ter notas mais baixas nos testes do Saeb, prova determinante para o Ideb..
Com isso, objetivo da educação que deveria ser o de, segundo a Lei de Diretrizes da Educação (9394/96), desenvolver o educando, preparar para a Cidadania e qualificar para o trabalho, tem sido o de gerar índices positivos que, por sua vez, impactam na avaliação política de um governo ou governante.
Enquanto escolas da rede privada investem cada vez mais em ferramentas para que seus alunos alcancem o ensino superior, principalmente nas universidades públicas, vemos as escolas públicas irem na contramão e priorizar uma prova, um índice que não representa a realidade da educação.
Segundo os dados do Censo do Ensino Superior, divulgados em outubro de 2024, 59% dos jovens que concluíram o ensino médio em escola particular em 2022 ingressaram em uma graduação no ano seguinte. Entre os alunos egressos de redes estaduais, esse percentual é de 21%. O dado é preocupante.
No Paraná, o governo trabalha para que essa discrepância seja ainda maior. A prova Saeb deste ano é uma constatação disso. O conteúdo e a formação dos estudantes tem sido deixados de lado para dar lugar a treinamentos sucessivos, provas, aulões específicos nos temas ligados ao Saeb. O foco é apenas um: melhorar o índice do Ideb e “manter” o Paraná como “melhor educação do Brasil” na propaganda institucional, a fim de alavancar uma possível candidatura do governador ao mais alto cargo do executivo brasileiro.
Desde que assumiu o executivo paranaense, optou por transformar o órgão público em uma espécie de laboratório da iniciativa privada. Ratinho Jr trouxe para o cargo de secretário, Renato Feder ligado à fundação Lemman que, por sua vez, é ligada ao mega empresário Jorge Paulo Lemman que acionista controlador da Anheuser-Busch InBev, a maior cervejaria do mundo. Feder, por sua vez, substituiu diversos cargos de chefia antes comandados por educadores por diversos Trainees vindos de outros locais e outros ramos de atividade.
Desde então, a educação passou a ser tratada como produto e a gestão da secretaria como se fosse uma empresa. Metas, relatórios, tutorias, programas de monitoramento, plataformas digitais são alguns termos que passaram a fazer parte do dia de professores, funcionários e gestores educacionais que a partir de então, segundo Feder, formariam um “time” cujo objetivo era “vencer”. Vencer, porém, para o governo do Paraná era sinônimo de aprovação a qualquer custo. O objetivo era enxugar os gastos com a educação pública para focar no mais importante para seus mandatários: repassar recursos para a inciativa privada e conquistar altos índices de aprovação junto à população.
O plano incluiria o sufocamento de qualquer iniciativa de contraponto, iniciando pelos sindicatos de servidores. Como a tentativa de destruição financeira não surtiu efeito, pois os servidores continuavam se organizando através das entidades representativas, Ratinho partiu para a destruição do serviço público. Privatizar para conquistar passou a ser o seu lema. Com menos servidores de carreira, menor organização e questionamento ao seu governo.
Como um dos exemplos desse processo Ratinho acabou, em plena pandemia, com a carreira de funcionários da educação (secretários, merendeiras, pessoal da limpeza, bibliotecários) que passaram a ser contratados através de empresas privadas com menores salários e alta rotatividade. O salto foi de um gasto público de R$ 300 milhões em 2025 para cerca de R$ 1 bilhão em 2025. Menos funcionários, com menores salários, sem qualquer vínculo com os estudantes ou com a escola e gastando mais. Quem ganha com isso?
Outra iniciativa foi, em 2024, quando Ratinho decidiu privatizar escolas. Sem qualquer diálogo efetivo com a sociedade repassou para a iniciativa privada a gestão de centenas de escolas estaduais. Com apenas uma empresa o contrato gira em torno de R$ 500 milhões em 4 anos, sem transparência e sem melhoria da qualidade da educação.
Uma educação pública de qualidade não se faz apenas com índices, provas e treinamentos. Se faz com professores e educadores valorizados, de carreira, com concurso público, um bom e tranquilo ambiente de trabalho sem pressões, perseguições, assédio. Uma escola adequada é aquela que tem espaços adequados de ensino e aprendizagem, que acolhe e atente a todos, que tem participação ativa da comunidade. A escola precisa ser o lugar de felicidade dos nossos alunos, um lugar onde as siglas, os termos empresariais, as frases de efeito e motivacionais não tenham mais peso que o conhecimento.
(*) Luiz Fernando Rodrigues é funcionário de escola agente educacional II em Maringá, formado em Marketing e especialista em Gestão Escolar. Foi secretário estadual de comunicação da APP-Sindicato.