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Fezes humanas – o preço do luxo à beira do Igapó

O lago que deveria refletir o céu de Londrina virou um espelho turvo da arrogância urbana

Sim, nobres. O que corre hoje pelas águas do Lago Igapó não é poesia — é esgoto doméstico em estado bruto. Fezes humanas, urina, detergente e gordura descendo dos condomínios que se erguem como templos do luxo em torno do nosso principal cartão-postal.

O lago que deveria refletir o céu de Londrina virou um espelho turvo da arrogância urbana: o retrato de uma cidade que permitiu o adensamento predial em uma região ambientalmente sensível, sem exigir a devida contrapartida sanitária.
Durante anos, o poder público — municipal e estadual — autorizou novos empreendimentos sem garantir infraestrutura adequada de escoamento e tratamento de resíduos. O resultado está diante de todos: o esgoto dos privilegiados sendo despejado sobre o bem comum.

Um relatório ambiental sério, digno do nome, jamais teria permitido tamanha concentração de empreendimentos sem prever redes coletoras específicas, sistemas de contenção ou regras urbanísticas que evitassem o atual colapso. Mas o que se fez foi autorizar, autorizar e autorizar — porque a caneta pesa menos quando o bolso é cheio.

Agora, o lago agoniza e a cidade respira o cheiro do descaso.
E, se há uma verdade que o Igapó não pode mais esconder, é esta: quem mais lucrou com a degradação ambiental precisa arcar com o custo da recuperação.

Hora de reverter o fluxo: quem suja, paga
É preciso instituir um fundo permanente de despoluição e manutenção do Lago Igapó, financiado por quem dele se beneficiou diretamente — construtoras, incorporadoras e moradores da faixa de adensamento que valorizou com o espelho d’água.
Não se trata de punir, mas de restaurar a justiça ambiental: quem ajudou a sobrecarregar o lago deve contribuir para limpá-lo e preservá-lo.
O Legislativo municipal tem o dever de criar uma taxa ambiental específica, ou uma contribuição de melhoria ecológica, com destinação vinculada à recuperação do Igapó e fiscalização pública do uso dos recursos.
E o Executivo, por sua vez, precisa agir de forma técnica, com transparência e urgência, apresentando um plano de saneamento e recuperação paisagística à altura da gravidade da situação.

Não é espuma: é esgoto
Trata-se de uma área nobre da cidade, valorizada justamente pelo bem comum que hoje se degrada: o lago.
Mas, ironicamente, os ricos estão literalmente cagando sobre o patrimônio coletivo, enquanto o poder público finge que é apenas “espuma natural, alfaces aquáticas” ou qualquer outro nome mais digestivo…

O Igapó é o espelho da cidade.
Mas o reflexo, meus caros, é de pura sujeira anal — e de uma elite que se acostumou a lavar as mãos enquanto suja o que é de todos.

Foto: Israel Marazaki

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