Quem, afinal, tem causado a distopia no mercado de trabalho?
De acordo com reportagem do Correio Braziliense, empresários de todo o Brasil têm enfrentado dificuldades para contratar jovens da Geração Z para o regime 6×1, aquele em que se trabalha seis dias para descansar um. A matéria aponta que essa geração valoriza o equilíbrio entre vida pessoal e profissional, busca flexibilidade e prefere empresas que ofereçam melhores salários e propósito.
Em Londrina, assim como em Maringá, a realidade vai além do que foi descrito em Brasília. Nos supermercados da cidade, o trabalho vai de domingo a domingo. As folgas, quando surgem, raramente coincidem com o fim de semana. Um domingo de descanso por mês, se tanto.
Há uma verdade que precisa ser dita: esse sistema não é nada atrativo. E como já dizia Renato Russo, “é o sistema que tem que mudar, se não — não muda!” Londrina, como boa parte do país, é o espelho de um modelo de trabalho que insiste em ignorar o próprio tempo histórico.
É justamente aqui, na ironia histórica, que a verdade se impõe: no antigo regime de escravidão, ao menos os quatro domingos do mês eram poupados do eito. Hoje, em pleno 2025, o “progresso” conseguiu reduzir a um único domingo…
Não é difícil entender por que tantos estabelecimentos supermercadistas em nossa cidade exibem cartazes de “contrata-se” há mais de um ano. A culpa, afinal, é mesmo da Geração Z — que se recusa a aceitar esse modelo — ou da Geração P, de Patrão, que ainda acredita que salário baixo e carga exaustiva são sinônimo de boa produtividade?
O problema não está nos jovens, mas na rigidez de um sistema ultrapassado que trata gente como peça. O mercado de trabalho precisa compreender que o século XXI exige eficiência com humanidade. E há saídas possíveis.
Uma delas é o modelo 12×36, em que o colaborador trabalha doze horas e descansa trinta e seis. Essa configuração, já adotada em setores como saúde e segurança, poderia suprir a necessidade operacional das redes supermercadistas sem massacrar seus funcionários — e ainda permitir que pessoas com maior necessidade financeira tivessem dois empregos. Com turnos bem distribuídos e escala transparente, o rendimento tende a aumentar — e o absenteísmo, a cair.
Não é apenas uma questão de direito trabalhista, mas de visão de gestão. Quem ainda acredita que “trabalhar até cair” é sinal de mérito, está condenado a assistir seu negócio minguar por falta de gente disposta a adoecer em troca de um quilo de carne por dia (equivalente a R$ 1.900).
Os jovens não abandonaram o trabalho — eles só não querem ser explorados. Estão pedindo o que qualquer ser humano lúcido pediria: dignidade, descanso e propósito.
É preciso cantar um viva à Geração Z — talvez sejam eles os únicos dispostos a nos libertar do tronco ao qual há tanto tempo estamos amarrados. E, se assim for, que continuem.
(*) Israel Marazaki — fiscal por instinto, cronista por raiva e sentinela por missão
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