O senhor da razão

De José Luiz Boromelo:
Um assunto que ganhou destaque na mídia recentemente são os problemas apresentados pelas próteses de silicone implantadas em milhares de brasileiras. É de pleno conhecimento do paciente que o produto tem prazo de validade e que o mesmo deve ser substituído de acordo com a recomendação do fabricante, a fim de evitar algum efeito danoso ao organismo. Nesse caso específico, existem registros de irregularidades com determinadas marcas de próteses em todos os países, mostrando a total falta de controle de qualidade em sua fabricação, expondo os usuários do produto a riscos dos mais diversos.
Foram verificados alguns casos de rompimento do invólucro protetor com vazamento e consequente absorção pelo organismo de silicone industrial, material altamente tóxico sendo proibido seu emprego nesse tipo de produto. Outros casos são divulgados com freqüência, em que cirurgias estéticas mal sucedidas acabam mutilando aqueles que procuram os recursos disponíveis da medicina para manter uma aparência sempre jovem. Por vezes, na ânsia de realizar o sonho em se atingir a perfeição, as pessoas submetem-se a todo tipo de procedimento sem certificarem-se previamente da competência dos profissionais da área, colocando a saúde e a vida em risco.
O ser humano procura por todas as formas manter-se com uma aparência sempre jovem, transmitindo saúde e confiança. Com isso acabam menosprezando as leis da natureza, em que o ser vivo tem seu ciclo natural de vida. E com o agravante da manifestação dos efeitos diretos das leis da física, entre eles a atuação constante da gravidade sobre nosso organismo. Daí a procura pelas próteses de todo tipo, muitas delas tão desproporcionais quanto o bom senso da candidata a utilizá-la e o comportamento exibicionista com a almejada conquista. É risível o desespero de celebridades, artistas, autoridades e pessoas com alto poder aquisitivo gastando verdadeiras fortunas para amenizar, estagnar ou tentar reverter os estragos da ação do tempo em sua aparência. Mais ainda quando aparecem ostentando os indícios dessa intervenção altamente invasiva que deixa suas marcas, às vezes aparentes. Existem casos em que a pessoa perde a sensibilidade na área atingida, ou tem a fisionomia totalmente alterada com uma expressão de sorriso permanente, sobrancelhas levantadas, pele esticada, nariz excessivamente arrebitado e outras imperfeições mais. Os resultados inesperados do puxa-estica acabam freqüentemente deixando sequelas físicas e psicológicas de difícil resolução, quando a intervenção não atinge os efeitos desejados.
Em que pese a necessidade do emprego das intervenções cirúrgicas para fins de correções reparadoras e estéticas, vale salientar que a beleza do ser humano não reside somente na harmonia das proporções, na perfeição de suas formas, no frescor de sua juventude ou ainda em sua privilegiada inteligência. Está presente principalmente em seu caráter, em sua índole voltada para o bem. O ser humano deveria buscar a verdadeira juventude da mente, do espírito. Deveria ainda considerar que todos inevitavelmente envelhecemos, mas a jovialidade adquire-se com exercícios diários de civilidade, de respeito aos preceitos morais, de tolerância no trato com seu semelhante. Isso inclui ainda generosas doses de amor, de compreensão e equilíbrio. Sabedor que a matéria viva perde naturalmente o brilho, a maciez, a elasticidade, a resistência e a capacidade de regeneração diariamente, nada mais sensato que transformar a experiência adquirida ao longo dos anos em aliada fiel para fazer frente à nova condição que os janeiros da vida invariavelmente nos impõem.
Estamos diante dos inúmeros exemplos de equívocos cometidos pelo ser humano em busca da juventude eterna, em que se evidenciam as futilidades de uma sociedade influenciada pelo imediatismo do culto ao corpo perfeito e da total falta de referências morais. A matéria retorna às suas origens, portanto, é inexorável nosso caminho para seu conhecido final, desde há milênios. E só o tempo para moldar a personalidade, aplacar as efervescências da juventude, mudar opiniões e conceitos e reafirmar os valores basilares de uma sociedade. Resta-nos então viver intensamente, respeitando as limitações biológicas naturais a que estamos submetidos, e vez ou outra, concordar com os ditados populares, alguns, bastante conhecidos. Porque, realmente, “o tempo é o senhor da razão”.
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José Luiz Boromelo (Marialva)
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