Greve: combate político

De Ana Lúcia Rodrigues-professora do DCS/UEM:
Ninguém dá nada a ninguém numa sociedade em que o coletivo é uma mera ficção e o individual é quem reina. Assim, resta às diversas categorias de trabalhadores se articular ou amargar a cassação dos poucos direitos que possuem, os quais no Brasil, nem chegaram a constituir condição de bem-estar mínimo a todos. Afinal, o bem-estar está à venda no mercado. Por isso, os trabalhadores devem se tornar protagonistas de uma luta em vias de ser construída e praticada, para explicitar as contradições e os conflitos desta sociedade que a elite econômica – incluindo as altas rendas e as que desejam ser altas (aquelas dependuradas nos limites bancários e nos “carnezões”) – e a elite política – aquela que vem assegurando ao capital que lhe financia acesso aos fundos públicos – insistem em não querer enxergar. São os “sem acesso”; os “sem parcelas”; os “sem direitos” os que devem e podem tornar visível, dizível e contável aquilo que o poder não vê, não diz e não leva em conta em suas políticas corporativistas (para relembrar Rancière). Corporativismo que serviu, na prática, para desmantelar o pluralismo sindical (acusado de promover atividades anti-sociais e comunistas) e para instituir o “sindicato” enquanto apêndice do Estado.
Nesse momento vemos um movimento em que os trabalhadores das universidades (apoiados em sindicatos que estão cumprindo o papel autônomo que lhes compete), expropriados dos seus direitos mínimos reverteram a prática da conciliação e da paz social e se colocaram como sujeito político, como uma classe organizada com reivindicações absolutamente justas. Reivindicações que deveriam ser do conjunto de todos os servidores das universidades paranaenses. Pois, nossas instituições estão morrendo à míngua sem quadros técnicos que realizem as atividades-meio, para viabilizar as atividades-fim: o ensino, a pesquisa e a extensão.
Torna-se imperativo, assim, reunir nesta ação o conjunto dos servidores e dos alunos das universidades públicas paranaenses, incluindo os sujeitos que ainda não se identificam com este combate político. Sim, pois trata-se aqui de um combate contra um Estado que está sucateando nossas instituições até um ponto em que o coro de vozes (equivocadas), hoje já ouvido, será talvez engrossado por muitas outras e o próprio servidor público implorará ao Estado: terceirize as universidades!!! Entregue o maior patrimônio público intelectual do estado para um grupo de investidores privados detentores de saber neoliberal competente!!!
Será tão difícil à intelligentzia universitária perceber que a reinante sabedoria consensual neoliberal não reconhece legítima a heterogeneidade social e as contradições e conflitos a ela inerentes? E que, o que está em curso neste, como em qualquer movimento de greve, é o efetivo fazer política, a manifestação da contradição, do conflito, da desigualdade que fazem parte desta sociedade, mas somente se manifestam pelo dissenso, pela perturbação da “ordem”. Por exemplo, num movimento deste, que atrapalha a vida de muita gente, é quando se dá a possibilidade de mudar o que é hegemonicamente visível, dizível, contável.

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