Feliz Natal

Do padre Orivaldo Robles:
padreorivaldoNesta época de Natal, é comum pessoas afirmarem que são tomadas por tristeza, não por alegria. Mal começa dezembro e, para convocar todos às compras, irrompem melodias natalinas, não executadas, mas marteladas de manhã à noite em nossos desesperados ouvidos. No coração de boa parcela do povo se instala um sentimento de estranha melancolia. Bestificados pelo vulgar brilho de luzinhas chinesas e ruídos ininterruptos que dominam as ruas, não nos damos conta dos infelizes que tudo fariam, se pudessem, para deixar de atender a incontrolável volúpia de comprar. Nem sempre notamos, mas eles sobrevivem em nosso meio, em número maior do que supomos, agredidos pelo consumismo que se escancara ainda mais nestes dias. Como bois tangidos a moderno matadouro não veem escapatória da via trilhada por tanta gente. No íntimo, suportam o confrangimento do peso ou da desilusão a que a maioria, sem perceber, se entrega. Caminham no meio de uma turba estranha com a qual de maneira alguma se identificam. E na qual não pediram para viver. Nasceram e se criaram em outro mundo e noutro tempo. É difícil esconder a angústia de não dispor mais da rota que palmilharam e lhes apontava uma direção. Hoje tudo mudou. Ficaram sem rumo.
O leitor, alguma vez, deu-se ao cuidado de observar os olhos daqueles com quem cruza nos horários noturnos de compras? Não nos shoppings, que aí não pisam plebeus moradores de arrabaldes da bela urbe. Mas ali na rua, no estirão bruto das calçadas malfeitas, que borbulham, nestas horas, de homens e mulheres a puxar de arrasto crianças com frequência tristes e mal nutridas. Revelam olhos baços de quem se acostumou à escassez de uma vida inteira de privações. E, contudo, erguida sobre labor honrado e digno, único que sempre conheceram. Estes são os que fazem o país crescer. Os que trabalham e produzem. Estão aí. Gastando. Pondo a girar a roda da economia. Apesar da miséria que recebem no fim do mês. São os reais construtores dos índices econômicos que tanto preocupam dirigentes da nação. É para a pobreza dos seus bolsos que se dirige a grita de anúncios, a zoeira de alto-falantes invasores da madrugada. Eles têm pés trôpegos e olhos cansados de tanto caçar uma alegria que nunca chega. Todo final de ano é a mesma ladainha. O Natal volta de novo. Faz renascer a esperança de que, desta vez, uma vez, quem sabe, conquistem o decantado feliz Natal e próspero Ano Novo.
Cá para mim, calculo ser esse o motivo da incômoda tristeza que muita gente vive no Natal. Vezes sem conta passou por esse dia. E alimenta a impressão de que ele só vem piorando. Tempo houve em passado assim nem tão distante, quando não se acendiam luzinhas, não se tocavam musiquinhas nas ruas, não brilhavam shoppings nem se entupiam calçadas com gente carregando pacotes e sacolas coloridas. Em compensação, os rostos estampavam sorrisos. Havia verdade nas palavras, confiança nos olhares, franqueza nos corações. Não essa violência que agora tanto assusta. Ninguém queria ser melhor nem mais importante que ninguém. O Natal se festejava com uma refeição mais caprichada e festiva. E com mais pessoas à mesa. Talvez a gente vivesse Natal no ano inteiro. Ou, pelo menos, tentava.
É… Acho que muita gente tem razão de ficar triste nos natais de hoje.

P.S. – Feliz Natal. Abençoado Ano Novo. Agradeço gestos e palavras de carinho que recebi. Até fevereiro os leitores estão livres de mim.