Só resta a você os amigos que conquistou

ademar

De Ademar Schiavone, em sua coluna “Memórias de um bom sujeito”, no Jornal do Povo de domingo passado:

Conhecemo-nos quando ele chegou a Maringá no início da década de l950, jogando futebol nos campos de terra que existiam às dezenas em nossa cidade.
A amizade e o tratamento cordial sempre foi uma constante em nossas vidas.

Participávamos das brincadeiras dançantes no salão Amarelo do Grande Hotel ou no Aero Clube e no Grêmio dos Comerciários, como todos da nossa época.
Mas, a amizade foi se acentuar mesmo, quando ingressamos na primeira turma da primeira faculdade de Maringá, a Estadual de Ciências Econômicas, juntamente com outros amigos e que somavam vinte e oito. Com o passar dos anos, alguns foram ficando pelo caminho, repetindo o ano ou desistindo do curso.
Em 1964 concluímos o curso em quatorze.
Turma extremamente unida e da mesma idade que fazia questão de continuar unida.
Ademar Schiavone, Antonio Francisco Perioto, Donaldi Serra, Farid Curi, João Galdino de Medeiros, João Slongo, Keniti Makishi, Raul Paulo Neto, José de Almeida Guimarães, José Pereira dos Anjos, Paulo Rubens de Lima, Shinitiro Shima e
Takaki Sakamoto.
Desses apenas oito estão vivos.
O último a falecer, no dia de Natal passado, foi Donaldi Serra.
Uma pena, o Donaldi era o cantor da turma.
Sempre foi assim, desde os tempos de jovens, quando fazíamos serenatas para as namoradas. Todos iam e se esforçavam para cantar. Que nada. Quem puxava o tom e cantava bem mesmo era ele. E o acompanhamento era o violão do Raul.
Neste ano, como em anteriores, nos reunimos apenas para rememorar as aventuras e as brincadeiras do tempo da faculdade. Da dificuldade em implantar o CARSI – Centro Acadêmico Roberto Simonsen, que depois transformamos em Darsi até na dificuldade em manter namoro àquele tempo. Todos eram santo Antonio na ajuda dos encontros e dos papos.
O encontro foi em abril passado na casa de praia do Farid Curi.
A Cida, minha mulher, estudava junto da June, mulher do Donaldi e eram amigas muito unidas.
Os pais da June mudaram-se para São Paulo, e ela foi junto. Em fins de semana ele viajava para a capital paulista ver sua amada. Mas, o compromisso com o Banco do Brasil onde ele fez carreira, acabava impedindo muitas das viagens.
Achamos a solução: a June vinha prá minha casa, onde ficava hospedada e o Donaldi ia lá namorá-la. Isso acabou por apressar o casamento feliz e alegre que perdurou até o Natal passado.
Numa das noites de seresta, geralmente na sexta-feira, já madrugada alta, resolvemos ir cantar na casa de Dom Jaime, diretor da faculdade. Acho que ele dormia pouco. Alguns minutos depois de começarmos a cantoria, ele abriu a janela e ficou alguns minutos observando. Resolvemos ir embora e nos despedimos do nosso Bispo. Ele não deixou. Abriu a porta e fez a gente entrar. Serviu-nos uma cachaça das boas. Acabamos com o litro rapidamente.
Como o dia estava amanhecendo a sua empregada levantou-se e veio até a sala. Dom Jaime pediu que ela fosse comprar pão e manteiga e fizesse um café com leite. Resultado: só saímos dali pelas sete horas.
Como todos éramos solteiros não precisamos correr nenhum risco de separação por justa causa.
Doutra feita, o Paulo Rubens organizou uma pescaria num córrego que passava nos fundos da chácara de seu pai, o professor Ari de Lima. Sempre na única condução que tínhamos, fomos na Kombi do Raul. Para chegar aos fundos da chácara, era preciso ir a pé. E lá fomos. O Perioto e o Shima carregavam o engradado com cerveja quente que era prá esfriar no rio.
Uma comédia aquela aventura. O Perioto enfiou o pé num brejo e os sapatos ficaram lá atolados. Ele ficou muito brabo. O sapato era novinho.
O Paulo Rubens com as varinhas de pescar e o Farid com um rifle 22, iam na frente. Bem mais atrás vínhamos o professor James da Silveira, super integrado com a turma, o Donaldi, com um chapéu de palha bem grande e eu.
O Farid resolveu tirar o chapéu do Donaldi com um tiro e avisou.
De repente o estampido e a bala fez com que o chapéu voasse longe. Mas a bala veio mais baixa e raspou a cabeça do Donaldi. O sangue correu pelo rosto. Todos ficaram apavorados. Quem tomou conta da situação foi o James. Derramou cachaça na cabeça dele e verificou que a bala passou de raspão e não havia necessidade nem de dar pontos.
Ainda bem.
Passado o susto restou a imagem do Donaldi passando a mão na cabeça e repetindo: “você teve coragem, Farid?”
Quando a gente se reunia rememorava as aventuras, as brincadeiras e as alegrias que tivemos. E que foram muitas.
O Perioto, o Paulo Rubens, o Keniti, o José Pereira, partiram primeiro. Dessa vez foi o Donaldi Serra.
Um bom sujeito. Dos melhores que conheci ao longo da minha vida e um amigo em quem confiava cegamente.
A turma vai diminuindo. É o resultado de vivermos muito e de termos idades semelhante. Daqui a pouco vamos nós. E, como diz o Farid, nos reuniremos no céu, com a mesma alegria de sempre.

Advertisement
Advertisement