“Comentário infeliz”

Para Grupo de Pesquisa em História das Crenças e das Ideias Religiosas do DHI da UEM , fala do prefeito afrontou Constituição, o Estado laico e o Estatuto da Criança e do Adolescente

O Grupo de Pesquisa em História das Crenças e das Ideias Religiosas do Departamento de História da Universidade Estadual de Maringá divulgou nota em que critica a resposta que o prefeito de Maringá à fala feita na segunda-feira, na entrega de armamentos para a Guarda Civil Municipal. Antes ele havia dito que moleques que roubam fiação merecem “uma surra” e ontem divulgou um vídeo dizendo ter sido mal interpretado.

Para o grupo a fala é uma “afronta à Constituição Federal, ao Estado Laico e ao Estatuto da Criança e do Adolescente” e diz esperar que a fala do atual prefeito seja alvo das “devidas ações administravas, civis e criminais” sejam tomadas.” Confira a íntegra da nota:

“É com preocupação que nos deparamos com um vídeo publicado pelo atual prefeito de Maringá, na noite de 3 de junho de 2025.
O vídeo que teria intuito de explicar o comentário feito sobre “esses moleques que roubam fios elétricos e cabos de telefonia merecerem uma surra bem dada”. Ao invés de se desculpar pelo comentário infeliz (para dizer o mínimo), feito, Indevidamente, por um gestor público, ele argumenta “O que eu comentei não é para estimular violência, muito pelo contrário. Eu sou crente e eu creio na palavra de Deus, na Bíblia como fonte de sabedoria. Olha o que que tá escrito aqui: Provérbios 13: 24, O que não faz uso da vara odeia o seu filho, mas o que o ama, desde cedo o castiga. Provérbios 22:15 diz assim: A estultícia ou a insensatez está ligada ao coração da criança, mas a vara da correção a afugentará dela. Provérbios 29: 15 A vara e a repreensão dão sabedoria, mas a criança entregue a si mesma, envergonha a sua mãe. Provérbios 26, 3 O açoite é para cavalo, o freio é para o jumento e a vara é para as costas dos touros”. E segue argumentando que essas “recomendações” não estão apenas no Velho Testamento, citando “Hebreus, capítulo 12, verso 6: Porque o senhor corrige o que ama e açoita a qualquer que recebe por filho”. E segue dizendo que, “Essa regra de que ninguém pode ser disciplinado e nem corrigido não está fazendo uma geração melhor. Eu acredito mais nessa aqui que funcionou na minha geração”.

A fala é uma afronta à Constituição Federal, ao Estado Laico e ao Estatuto da Criança e do Adolescente. Nos atentando ao tema do posicionamento religioso e uso da Bíblia enquanto embasamento por um gestor público, cabe lembrar que Estado laico é aquele que não adota religião oficial, não interfere nos assuntos religiosos (exceto quando relacionados com questões jurídicas) e não é influenciado por nenhum viés unilateral religioso, ou seja, é independente de qualquer religião. Que qualquer indivíduo busque inspiração para sua conduta pessoal nos escritos bíblicos, é uma coisa. Mas enquanto prefeito, político e gestor público, tem o dever de governar com base na Constituição e nas leis, promovendo o bem-estar da população e a justiça social, independente de suas convicções religiosas. A fala do prefeito é perigosa, pois abre espaço para que qualquer um atue conforme o entendimento próprio que tem de sua religião, nos órgãos públicos e na esfera pública. E destaque-se o uso do termo ‘entendimento próprio’, pois o prefeito não é representante, com fala autorizada, das diversas denominações religiosas cristãs que são abarcadas pelo termo “crente” e a leitura que ele faz do uso da Bíblia, está longe de ser universal. Ataca-se, portanto, a laicidade e a própria filiação religiosa.
O grupo de Pesquisa em História das Crenças e das Ideias Religiosas (DHI-UEM) se posiciona de forma contrária à essa fala do atual prefeito e espera que as devidas ações administravas, civis e criminais sejam tomadas.
Grupo de Pesquisa em História das Crenças e das Ideias Religiosas – DHI/UEM