CC pede pra sair: ‘Fui vítima de assédio moral dentro do paço municipal’

Servidora pública anunciou exoneração em rede social e diz ter sofrido constrangimentos, desrespeito e humilhações
Ao comunicar que, a partir de hoje, não faz mais parte da atual gestão municipal de Maringá ela conta que a exoneração “não foi motivada por questões administrativas ou técnicas, mas sim por motivos extremamente graves e inaceitáveis: fui vítima de assédio moral dentro do Paço Municipal”.
Em rede social, Meire Cristina Pinheiro Gabriel, que ocupa cargo comissionado na administração municipal, publicou hoje sua carta de exoneração, dirigida ao prefeito Silvio Barros II (PP) e à ex-secretária de Aceleração Econômica e Turismo, Isoledne Niedermeyer, embora o cargo seja ocupado atualmente por Annibal Bianchini. Na carta ela relata ter sofrido situações de constrangimento, desrespeito e humilhações.
Em janeiro do ano passado ela foi nomeada na Secretaria Municipal de Políticas Públicas para as Mulheres e posteriormente foi para a Saet. “Durante meu período de trabalho, sofri reiteradas situações de constrangimento, desrespeito e humilhações que afetaram não só meu desempenho profissional, mas também minha saúde física e mental.
Denunciei internamente o que vinha acontecendo, esperei providências, acreditei em diálogo e respeito institucional. No entanto, nenhuma atitude concreta foi tomada por parte da gestão. O silêncio e a omissão se tornaram cúmplices da violência.
Este não é um caso isolado. E é justamente por isso que decidi tornar pública esta situação: para que mais ninguém precise passar por isso calado(a). Assédio moral é crime, é uma forma de violência psicológica, e deve ser combatido, especialmente dentro do serviço público, onde o respeito ao servidor e à dignidade humana deveria ser inegociável.
Saio de cabeça erguida, com a consciência tranquila de quem sempre trabalhou com ética, dedicação e compromisso com o bem público. Mas não me calarei diante da injustiça.
Que este caso sirva de reflexão e também de cobrança: qual é o ambiente que estamos permitindo dentro das instituições públicas? Assédio moral é sério. E silenciar é ser conivente”, desabafou.
Na carta ela diz que o superintendente da Saet [Wanderson Carlos da Silva, irmão do deputado estadual Soldado Adriano José, do PP] passou a instruir seus nomeados a boicotar a autoridade da ex-secretária; ela afirma ter tentado se manter neutra, mas teria sido alvo de retaliação.
No início de setembro o Blog do Rigon já havia informado sobre o climão na Saet; o superintendente ficou sem aparecer na sede da secretaria durante semanas e teria sido o pivô da mudança ocorrido poucos dias depois. Meire ocupava o cargo por indicação do vereador Sidnei Telles (Pode).
Confira a íntegra da carta de exoneração:
Excelentíssimo Senhor Prefeito Municipal, Silvio Magalhães Barros II, e Senhora Secretária de Aceleração Econômica e Turismo, Isolene Niedermeyer,
Eu, Meire Pinheiro Gabriel, servidora pública ocupante de cargo em comissão sob matrícula nº 75.510, venho, muito respeitosamente, solicitar minha exoneração do cargo, pelas razões que passo a detalhar.
Minha trajetória profissional e como agente político sempre foi pautada pelo compromisso público. Ex-assessora parlamentar, engajei-me ativamente no desenvolvimento de nossa cidade e do Estado do Paraná. Sou também uma liderança na Igreja Católica, atuando principalmente em projetos de evangelização e de apoio a mulheres.
Nos últimos anos, trabalhei no CRAM (Centro de Referência de Atendimento à Mulher), prestando acolhimento primário a vítimas de violência doméstica, acompanhando processos na Delegacia da Mulher e coordenando ações com a Guarda Municipal. Muitas vezes, enfrentei situações de risco, confrontando agressores que tentavam invadir o local, sempre em estreita colaboração com psicólogas e assistentes sociais.
Fui inicialmente nomeada para a Secretaria da Mulher, o que me trouxe grande alegria pela oportunidade de dar continuidade a esse trabalho. Contudo, a então secretária, ao tomar conhecimento do meu diagnóstico de câncer hematológico (que se encontra controlado), solicitou minha remoção sem sequer buscar informar-se sobre meu estado de saúde. A justificativa dada foi a de que “não queria uma doente de câncer na secretaria” – constituiu um ato de profunda humilhação e discriminação.
Em virtude disso, fui realocada para a Secretaria de Aceleração Econômica e Turismo, onde atuei no apoio aos artesãos e nas ações de turismo, desempenhando todas as demandas que me foram solicitadas.
A Secretaria, com poucos servidores estatutários, dependia de nomeados. Rapidamente, instalou-se uma cisão interna. O Superintendente passou a instruir seus nomeados a boicotar a autoridade da Secretária.
Busquei manter neutralidade, focando no trabalho. Entretanto, após aceitar um convite para um evento social da secretaria – contrariando uma ordem expressa do superintendente para que ninguém comparecesse – tornei-me alvo de retaliações sistemáticas por parte de seu grupo.
Por meu perfil proativo, envolvia-me em diversas frentes de trabalho, muitas vezes além do horário. Constatando que alguns colegas permaneciam ociosos, utilizando redes sociais durante o expediente, comentei em caráter privado com a gerente sobre a baixa produtividade. Infelizmente, meu comentário foi repassado aos interessados, que reagiram com extrema hostilidade.
O ápice do assédio ocorreu em um dia às (17h08), horário em que a maioria dos servidores já não estão mais presentes, quando fui convocada ao gabinete do superintendente. Ao entrar, três homens, conforme está na minha denúncia ao RH, fecharam a porta. Começaram a gritar, me chamar de “fofoqueira” e me intimidar fisicamente: senti o hálito de um na minha face, enquanto outro encostava a perna na minha. Sou uma mulher de 1,55m e 57kg, e me vi imobilizada e aterrorizada. Batiam na mesa, repetiam que nunca gostaram de mim e me ordenaram que, dali em diante, “não abrisse mais a boca”, entrasse quieta e saísse calada. Fui humilhada, xingada, ameaçada e coagida. Fizeram insinuações veladas de que “coisas piores poderiam acontecer”. Acreditei que seria agredida fisicamente. O terror da situação foi tanto que, involuntariamente, urinei nas calças e entrei em estado de choque, tremendo incontrolavelmente.
Segundo orientação da Secretária, formalizei uma denúncia de assédio moral junto ao Departamento de Recursos Humanos, que foi acolhida.
Apesar da proteção da secretária, testemunhei o Chefe de Gabinete acompanhar um dos meus agressores até nossa secretaria, aparentemente para interceder em seu favor e impedir que a secretária levasse o caso diretamente ao Senhor Prefeito.
Busquei auxílio psicológico para lidar com o trauma, enquanto a Administração parecia tratar o caso como uma mera “disputa interna por poder”, e não como o grave caso de assédio moral coletivo que foi.
Aguardei, em vão, que ao menos uma advertência fosse dirigida aos agressores. Pelo contrário, continuei a ser alvo de risos, olhares hostis e intimidações quando precisava circular pelo setor.
Não posso me calar diante de tal violência, em consonância com minha missão de vida na proteção das mulheres. Confesso minha profunda decepção com a Administração, especialmente após o discurso do Senhor Prefeito no auditório Dona Guilhermina, que nos encheu de esperança de que um novo tempo de respeito e fim do assédio havia se iniciado.
Diante do ambiente hostil e agressivo, da ausência de medidas protetivas efetivas que se tornaram uma punição por eu ter denunciado, e da aparente falta de interesse da Administração em combater tais práticas, concluo que não tenho mais condições de permanecer.
Meu pedido é irrevogável. A exoneração não é um desejo, mas uma necessidade para a preservação da minha integridade física e mental.
Atenciosamente,
Meire Pinheiro Gabriel Matrícula: 75.510