As emoções de um pai

Ah, o dia em que ela deu sozinha os primeiros passos, o dia em que pronunciou a primeira palavra, o dia em que jogou fora a chupeta

Por acaso me lembrei do caso, que aliás se deu faz uns muitos anos. Um amigo entrou na minha sala na “Folha do Norte”. Estava com os olhos miúdos de chorar de alegria. Acabara de levar à escolinha a filha de 3 anos para o primeiro dia de aula.

Naquele instante só Deus sabia que carga de emoções bulia lá no lá-dentro do jovem pai de uma só filha. Era uma experiência estranha aquela de deixar seu tesourinho entregue às professoras, no meio de tantas outras crianças até então desconhecidas.

Meu amigo deveria ir para o trabalho, contudo não tinha condições psicológicas para fazer coisa alguma. Por isso viera conversar, repartir seu nervosismo, contar o que estava sentindo, uma sensação esquisita.

Sentou-se, tomou um cafezinho, falou, sorriu, tomou outro cafezinho. Tirou do bolso o lenço, enxugou os olhos. Quem é pai pode imaginar a situação.

Dengoso e coruja, ele recordou a “biografia” da filha. O dia em que a esposa lhe comunicara a notícia: “Vamos ter um bebê”. Os meses de espera. Os mil planos. As primeiras dores. A corrida para a maternidade. Médicos. Enfermeiras. Ele no corredor andando pra-lá-pra-cá. De repente o chorinho… É menina!… É menina!

O pai ansioso para ver a filha, achar um telefone, espalhar a boa nova. Parentes e amigos chegando. A mãe ciumenta recomendando máximo cuidado com o bebê. Parece com a mãe, parece com o pai, é a cara da tia…

Ah, o dia em que ela deu sozinha os primeiros passos, o dia em que pronunciou a primeira palavra, o dia em que jogou fora a chupeta.

E agora ela já estava na escolinha. O jovem pai ali chorando de felicidade, tomando cafezinho, olhando o relógio, querendo que o tempo passasse depressa para ele ir buscar a filhinha de volta…

E como seria o futuro dela? Quantas novas emoções estariam reservadas para o agitado coração do pai e o inquieto coração da mãe? A apresentação do primeiro namorado. A formatura. O casamento. O nascimento do primeiro neto.

Ah, os netos… Quando eles chegarem começará tudo de novo. As mesmas esperas,  as mesmas alegrias, os mesmos sustos, o mesmo enredo. Se você é pai sabe muito bem como é isso. Se é avô ou biso sabe melhor ainda.


(Crônica publicada na edição de hoje do Jornal do Povo)

Foto: Tatiana Syrikova/Pexels