Vá procurar a Justiça
Por Rômulo Paiva:
Dentro das relações trabalhistas, a frase “vá procurar os seus direitos na Justiça” tem sido pronunciada com frequência nos últimos tempos. A taxa do desemprego nacional beirando a casa dos 12 milhões de pessoas e a morosidade do Judiciário colaboram para isso, assim como a mudança de comportamento da classe empresarial – atenta a isso – também tem ajudado.
Diferente do que ocorria há 10 ou 15 anos, quando no ato demissório se honrava primeiramente as verbas rescisórias e, residualmente, remanescia aqueles que encaravam o processo trabalhista, hoje é cada vez mais comum deixar todas as verbas para serem quitadas na presença do juiz. As empresas demitem e não pagam nada. 00Mandam o trabalhador procurar a Justiça, sem fornecer qualquer documento e, a depender do tipo do desligamento, fica travada a baixa da carteira profissional, liberação do valor do FGTS, seguro-desemprego e verbas rescisórias.
Quem paga com atraso, o faz mais caro. Na CLT, duas são as multas corriqueiras. A primeira prevê o pagamento das parcelas da rescisão até o primeiro dia útil imediato ao término do contrato ou até o 10º dia, contado da data da notificação da demissão, quando da ausência do aviso prévio, sob pena de pagar um salário.
A segunda estabelece que, no caso de rescisão de contrato, havendo controvérsia sobre o montante das verbas rescisórias, o patrão é obrigado a pagar, à data do comparecimento à Justiça do Trabalho, a parte incontroversa dessas verbas, sob pena de pagá-las acrescidas de 50%.
O problema é que essas multas deixaram de ser ameaça. Em tempos de crise e demissão em massa, é comum até encontrar juízes estimulando o trabalhador a abrir mão da multa para viabilizar o acordo, parcelado em várias vezes. Negociar com quem está sem receber nada fica, portanto, mais fácil, principalmente numa época que audiências iniciais são marcadas com meses ou ano. Os patrões percebem isso e utilizam tal realidade contra o empregado.
A banalização dessa prática, contudo, tem provocado a judicialização exagerada. De acordo com dados do Tribunal Superior do Trabalho, o número de processos trabalhistas no Brasil teve aumento de 12,3% em 2015, recorde atingido com 2,6 milhões de ações. Em 2016, números preliminares do TST já registram 6,3 milhões de processos.
O orçamento da Justiça do Trabalho sofreu tesourada na época que mais precisava. A Lei Orçamentária Anual (Lei 13.255/16) promoveu corte de 90% nas despesas de investimento e de 24,9% nas de custeio no orçamento da Justiça do Trabalho. Paradoxalmente, a motivação do relator do orçamento, deputado Ricardo Barros (PP/PR), para justificar tais medidas foi o excesso de “judicialização dos conflitos trabalhistas, na medida em que são extremamente condescendentes com o trabalhador”.
Como consequência, vários tribunais já ameaçam fechar as portas. E mendigam a abertura de créditos suplementares. As restrições financeiras, além de causar submissão orçamentária e colocar em xeque a autonomia da Justiça, é um duro golpe ao trabalhador e aos advogados, que ficarão sem um serviço público de qualidade e cada vez mais demorado.
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(*) Advogado. Publicado originalmente no Diário de Pernambuco