Entidades pedem justiça por jovens assassinadas

Doze entidades maringaenses divulgaram nota em que manifestam pesar e indignação com os assassinatos de Thaynara Moraes, 18, e Janine Naomi Ferreira dos Santos, 20, ocorridos ontem. As vítimas, negras, não tiveram como se defender. Além de pedir às autoridades a devida punição aos criminosos, a nota fala da onde de mortes e da forma como parte do noticiário policial referiu-se a uma das vítimas, que era mulher transgênero.

“Nesse domingo, Thaynara e Janine foram vítimas de um crime bárbaro, quando dois homens armados às surpreenderam, na residência onde moravam em Maringá, e as alvejaram, causando a morte de ambas. A motivação do crime ainda é desconhecida, todavia a forma como os assassinatos se deram causaram muita comoção. Ambas as vítimas não tiveram como se defender, Thaynara estava na cama ainda quando sua vida foi ceifada.
Vivemos atualmente numa crescente onda de mortes de mulheres, sobretudo no que tange às mulheres transgêneros e travestis.
Importa destacar que, desde 2015, o legislador trata homicídios praticados contra o “sexo feminino” como crime qualificado por feminicídio, levando a exasperação da pena para 12 a 30 anos de reclusão. Porém, a aplicação dessa qualificadora ainda gera muita discussão nos tribunais e grande parte da jurisprudência tem entendido que o feminicídio só ocorre quando o crime se dá no ambiente doméstico ou decorrente dela ou de relação afetiva, ou ainda por motivação de gênero.
Para além da discussão se foi feminicídio ou não, inclusive porque não se sabe ainda a motivação do crime praticado contra Thaynara e Janine, trata-se de um crime bárbaro e chocante, o qual não possibilitou a defesa das vítimas. A sociedade maringaense não suporta mais tanta violência praticada contra as mulheres, razão pela qual registramos nosso pesar e indignação.
Destaca-se, outrossim, que as vítimas eram negras, o que se mostra bastante sintomático, mormente porque as mulheres negras representam a maioria das vítimas de homicídio e feminicídio no Brasil (2 em 3 vítimas são negras, conforme dados da Folha de São Paulo de 19 nov. de 2020). Nesse sentido, expressamos a nossa vigilância sobre o caso e requeremos às autoridades competentes que se dediquem a levar à justiça os criminosos que destruíram a vida dessas duas jovens e levaram dor e sofrimento às famílias e amigos.
De outro lado, é notório o aumento de violência praticada contra mulheres na pandemia de covid-19, tanto cisgêneros quanto transgêneros e travestis, enquanto que o orçamento de políticas para mulheres sofre franca queda, no Brasil. De 2016 a 2018, houve redução de 68% dos investimentos em políticas públicas para mulheres, sendo que o setor mais afetado foi o de combate à violência. No ano subsequente, o corte foi ainda maior: em 2015 foram investidos 119 milhões para tais ações, enquanto que em 2019 o investimento foi de 5,3 milhões. Para o ano de 2021, o valor empenhado para a Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres foi 19% menor que o ano anterior, conforme informações noticiadas pelo site da Câmara dos deputados. Dessa forma, fica evidente o desmonte nacional das políticas públicas para mulheres, sobretudo no que tange ao combate à violência. Diante de dados tão alarmantes, a sociedade civil organizada subscritora dessa nota deixa o seu total e absoluto repúdio aos referidos cortes orçamentários.
Entendemos que a redução de políticas públicas voltadas para prevenção de violências praticadas contra mulheres é concorrentemente responsável pelo aumento de crimes que as vitimam todos os dias no Brasil. Nesse contexto, frisa-se que não é possível implementar políticas públicas de combate à violência sem o respectivo empenho orçamentário. Por isso, a redução sistemática de investimento é inaceitável.
Outro ponto que chama atenção é a referência que a mídia fez em relação à Thaynara ao informar sobre o crime. Em contato com amigos e familiares, soubemos que Thaynara se identificava mulher transgênero e não como travesti (trata-se de identidades de gênero que não são iguais). Dessa forma, é necessário que se corrija tal referência, uma vez que foram publicadas reportagens que se referiam à Thaynara como travesti.
Em uma das reportagens veiculadas, o jornalista utilizou o nome de batismo, “masculino”, para se referir à Thaynara, o que demonstra total desprezo pela identidade de gênero da vítima. Nesse caso, a transfobia não é sequer velada, uma vez que o nome social da vítima foi completamente ignorado. À vista disso, repudiamos esse tratamento desrespeitoso para com uma jovem negra e transgênero, a qual já sofreu violência atroz.
Aproveitamos o ensejo para enfatizar a importância de ser criada no Estado do Paraná uma lei que verse sobre o uso do nome social em lápides e nos atestados de óbito de travestis, mulheres transexuais, homens transexuais e demais pessoas trans, a exemplo da Lei 6804/21 do Distrito Federal. A omissão do Legislativo paranaense acerca desse tema termina por violentar novamente a vítima Thaynara, a qual não poderá ter seu nome reconhecido, ainda que pós mortem.
Por fim, expressamos os nossos sinceros sentimentos e pêsames às famílias enlutadas e clamamos por justiça.
Maringá, 30 de maio de 2021.
Fórum Maringaense de Mulheres
Conselho Municipal da Mulher de Maringá
Mães do Ingá
Ong Maria do Ingá
Movimento Mais Mulheres No Poder
Observatório das Metrópoles – Maringá
Instituto de Mulheres Negras Enedina Alves Marques
Ong Resistrans Direitos da População de Transgêneros e Travestis
Associação dos Docentes da Universidade Estadual de Maringá
NUDISEX – UEM – Núcleo de Estudos e Pesquisas em Diversidade Sexual
AMLGBT – Associação Maringaense de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais
CEVIGE – Comissão de Enfrentamento à Violência de Gênero da OAB/Maringá”